Especiais Volta Rápida

sábado, 26 de outubro de 2013

Senna, The First - Parte 1



1988 marcou o estágio final para os motores turbos, numa manobra que já havia sido iniciada ainda em 1987 quando a FISA começou a sua caçada a estes propulsores que estavam atingindo níveis absurdos de potência e também de preço. A fim de dar um pouco mais equilíbrio para os mundiais em disputa e, principalmente, ajudar na sobrevivência de times médios e menores que mal tinham dinheiro para poder trabalhar no desenvolvimento dos turbos, a entidade trabalhou para que estes motores tivessem uma “morte” lenta na categoria: primeiramente em 1987, com criação dos troféus Jim Clark e Colin Chapman para o piloto e equipe “campeões dos aspirados” que não passou apenas de um incentivo para encorajar a mudança. Nestes campeonatos paralelos, a Tyrrell levou os dois troféus para casa, uma vez que seu piloto Jonathan Palmer venceu o duelo contra seu parceiro de equipe Philippe Streiff para vencer o troféu Jim Clark. Um belo incentivo que foi banido já para 1988... Com relação aos turbos naquele ano, nenhuma mudança foi feita e todas as equipes que usavam a tecnologia puderam usufruir dela inteiramente. E coube a Nelson Piquet vencer o seu terceiro mundial, o segundo na era turbo, com a Williams-Honda Turbo após uma batalha contra Nigel Mansell. Mas para 1988 as coisas modificariam drasticamente.
Com a FISA empenhada em esmagar e desencorajar o uso dos Turbos, ela lançou duas mudanças no regulamento que pôs um ponto de interrogação descomunal na cabeça das equipes que ainda usariam este tipo de motorização: a queda de 4 bar para 2,5 bar no limite da pressão do turbo e a diminuição do tanque de combustível de 195 litros para 150. Uma pancada que fez muitos duvidarem do que poderia ser das últimas unidades turbos que alinhariam para aquela temporada, principalmente os Honda que já haviam mostrado o seu valor nos últimos dois anos. O consumo de combustível já era um pesadelo vivido por estas equipes turbo desde a proibição do reabastecimento após 1983, e foi muito comum ver pilotos ficaram a pé perto do término das corridas por pane seca. A diminuição da pressão atmosférica determinava o fim daqueles canhões de classificação que tomaram conta dos treinos nos últimos anos, com os motores a chegarem perto – e até ultrapassarem – a marca dos 1.400cv de potência que aliados aos pneus de classificação – que duravam, em média, duas míseras voltas – transformavam os F1 em bestas quase inguiáveis. Foi uma época mágica, mas igualmente perigosa.
Com estas mudanças esperava-se um embate entre Turbos e Aspirados, a tecnologia introduzida pela Renault onze anos antes ainda ditaria o ritmo da competição no seu último ano de existência e de um modo brutal.
Dos 18 times inscritos para aquele mundial, doze migraram para os motores aspirados para já se prepararem em vista ao mundial de 1989 que seria totalmente disputado entre motores de 3.500cc aspirados. As duas principais equipes que tomaram partido nesta mudança foram a Benetton e Williams sendo que a primeira optou pelo novo Ford Cosworth DFZ V8 de 600cv e segunda, a então atual campeã de construtores, que perdera o Honda Turbo para a McLaren, foi para o Judd V8 de 590 cv. Entre os “times turbo”, a Honda fornecia seu propulsor V6 debitando 675 cv para Lotus e McLaren enquanto que a Ferrari colocaria a sua unidade V6 de 690 cv na pista. As outras equipes com turbo no grid foram a Arrows (Megatron), Osella (Osella V8 – na verdade um Alfa Romeo 185 T que foi rebatizado de Osella) e o Zakspeed com um motor de 4 cilindros. Curiosamente o Osella – ou Alfa Romeo, como queira – era o mais potente dos turbos existentes, que despejava 700 cv de potência.
A Williams partiu para o uso dos motores atmosféricos após a perda do Honda Turbo para a McLaren e a equipe de Frank Williams enfrentou uma temporada de baixa confiabilidade, em especial com a suspensão ativa que apresentou vários problemas e forçou o time a usar a suspensão convencional em algumas etapas. A equipe teve pouco tempo para trabalhar no FW12 naquela ocasião e tanto Mansell quanto Patrese, tiveram algumas dores de cabeça naquela temporada. Mas havia um futuro menos nebuloso par a equipe
campeã do mundo, uma vez que eles usariam, a partir de 1989, os V10 da Renault.
Na contramão da rival, a McLaren conseguiu juntar um pacote fortíssimo naquele ano: além da obtenção do Honda Turbo, eles trouxeram Ayrton Senna para dividir o espaço com o bi-campeão do mundo Alain Prost. No campo técnico outro mestre se juntava ao time de Woking: Gordon Murray deixou a Brabham após 13 anos e agora assumia, ao lado de Steve Nichols, o projeto do MP4/4 que lembrava e muito o Brabham BT55 “Skate” com seu perfil baixo que fora um fracasso em 1986.
A Lotus também faria uso do Honda Turbo pela segunda temporada consecutiva. A equipe teve a presença de Nelson Piquet – junto de Satoru Nakajima - ao volante do novo 100T que prometia ser um rival a altura da McLaren, principalmente por ambas usarem o mesmo propulsor. Apesar do esforço do tri-campeão do mundo, o carro da Lotus não foi tudo aquilo que Peter Warr imaginava e talvez, se não fosse pelo motor, a temporada poderia ter sido ainda mais desastrosa e o resultado foi a saída do projetista Gerard Ducarouge. Aquele ano foi o inicio da decorrada do time inglês na F1.
Das três equipes grandes, era a Ferrari que parecia a mais forte no momento. As duas vitórias consecutivas de Berger no final de 1987 haviam dado um ar de que a equipe italiana poderia ter um grande ano em 1988 e isso foi reforçado após os testes em Jacarepaguá, onde o austríaco e Michele Alboreto deram as cartas. Mas os problemas políticos e técnicos privaram a equipe de avançar durante aquele mundial e a morte de Enzo Ferrari foi um duro golpe para os ferraristas. Apesar de ter sido a única equipe a incomodar a
McLaren naquele ano, a vitória em Monza acabou por ser um consolo para uma temporada que prometia ser das melhores para a “Rossa”.
Grande sensação das últimas temporadas, a Benetton continuou a sua escalada de sucesso agora com Alessandro Nannini e Thierry Boutsen no comando do belo B188 projetado por Rory Byrne. Apesar dos inúmeros problemas de confiabilidade do motor Cosworth DFR V8 no inicio do ano, foi possível ver a equipe multicolorida importunar – e ultrapassar - a Lotus em vários GPs. Na tabela de pontos eles conseguiram fechar na frente da tradicional equipe, marcando 39 pontos contra 23 da Lotus.
A Tyrrell, o melhor dos aspirados em 1987, contou com os serviços de Jonathan Palmer e Julian Bailey, mas o 017 projetado por Maurice Philippe e Brian Lisles não foi um bom carro naquele ano e equipe chegou a apenas 5 pontos no mundial de construtores, todos conquistados por Palmer, fora as penosas classificações. A Arrows teve um bom ano, se comparado com 1987 quando marcaram apenas 11 pontos. A experiência de Eddie Cheever e Derek Warwick levou o time chefiado por Jackie Oliver aos 23 pontos nos construtores, terminando empatado com a Lotus. O A10-B, projetado por Ross Brawn, pareceu ser um bom carro e talvez com um motor mais adequado pudesse ter ficado até mesmo entre os três primeiros na tabela de pontos.
A Larousse – ou L&C Lola – continuava abaixo da média e em algumas oportunidades um dos carros, pilotados por Philippe Alliot e Yannick Dalmas, mal conseguiam passar pelas classificações. A Zakspeed, que optara por um motor Turbo que levava seu nome, também teve que lutar as duras penas para tentar alinhar o seu carro durante os GPs, já que Bernd Schneider colecionou mais quilometragem andando a pé durante a temporada do que nas corridas. Ligier, AGS, Osella e Minardi – com Luís Perez Sala - também fizeram parte dos times que passaram a brigar pelas últimas colocações no grid. A chegada de novas equipes como BMS Scuderia Itália (usando chassi Dallara), RIAL Eurobrun e mais a Coloni, que faria o campeonato completo desta vez, fez ressuscitar as pré-classificações já que o regulamento permitia apenas 30 carros nas classificações. Com o número chegando a 31, apenas um pobre coitado ficaria de fora das qualys. Alex Caffi (BMS), Stefano Modena (Eurobrun), Oscar Larrauri (Eurobrun), Gabriele Tarquini (Coloni) e Nicola Larini (Osella), sabem bem contar essa história.
Dois pontos notáveis naquela temporada: a ausência da Brabham após 22 anos de categoria. Com o staff técnico de pernas para o ar, o team anglo-australiano nem havia conseguido arrumar uma parceria para fornecimento de motores e com Bernie ocupado com a sua função na FOCA, ele achou mais prudente retirar a equipe. Ele acabou por vender a estrutura para Walter Brun (dono da Eurobrun), que mais tarde a venderia para o suíço Joachim Luthi. O outro ponto - neste caso, positivo – foi a boa temporada da March
Leyton House que entregou a Ivan Capelli e ao novato Mauricio Gugelmin o comando do March 881-Judd projetado por Adrian Newey, que retornava à F1 após sua estadia nos EUA onde trabalhou com Bobby Rahal na TrueSports na Indycar e venceu os campeonatos de 1986 e 1987, além da Indy 500 de 86. A melhora do time inglês foi significativa e a pontuação saltou do mísero 1 ponto conquistado em 1987 para 22 em 88 – terminando na frente da Williams - sendo que Ivan Capelli mostrou boas performances com o March 881 em especial no Japão, quando ele chegou a discutir a liderança da prova com... Alain Prost.
Mauricio Gugelmin e Luis Perez Sala foram os dois pilotos estreantes naquele ano. Enquanto que o piloto brasileiro rumou para um team mais bem estruturado – March -, Sala desembarcou na Minardi, onde sofreu com o aprendizado e ficou de fora de alguns GPs após ser um dos quatro limados nos treinos classificatórios. Para o piloto brasileiro a vida foi mais “fácil” e ele pôde mostrar suas qualidades em situações adversas como no aguaceiro de Silverstone (quando marcou seus primeiros pontos após terminar em quarto) e também com tempos de classificação bem próximo – ou melhor – do que Capelli. Foi um bom ano de aprendizado para Gugelmin.
A pré-temporada realizada em março no Autódromo de Jacarepaguá, que agora passava a se chamar Nelson Piquet, foi de domínio absoluto da Ferrari com Berger e Alboreto nas duas primeiras posições da tabela de tempos. Gerhard conseguiu ser até sete décimos melhor que Alboreto, que foi três décimos melhor que Mansell. Um desempenho que chamou bastante a atenção e fez alguns apontarem a equipe italiana como forte favorita para a prova de abertura que seria realizada ali mesmo em Jacarepaguá em poucas semanas. Já outros, um pouco mais pessimistas – ou seriam realistas? – achava que o ótimo desempenho da Ferrari provinha do não uso da válvula pop-off, que limitava a potência dos turbos. O tempo alcançado por Berger tinha sido tão brutal, que os futuros protagonistas do campeonato haviam ficado pelo meio da tabela: o tempo de Gerhard foi de 1’28’’51, enquanto que o de Prost (6º) foi de 1’29’’86 e de Senna (7º) 1’30’’05.
Quando o campeonato começou para valer, as situações mudaram de figura.

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