quinta-feira, 15 de setembro de 2011

Relembrando Zanardi

Curva do "Saca-Rolha", Laguna Seca, 1996. Para quem já viu em câmeras on-board ou até mesmo jogou em simulaladores, sabe que o ponto de freada para chegar nela é um tanto irregular. O carro balança todo e qualquer descuido o carro pode sair de traseira e rodar. Em 96, na última etapa do campeonato da finada CART, o título estava aberto entre Jimmy Vasser, Al Unser Jr., Michael Andretti e o novato Alessandro Zanardi.
Faltando 5 voltas para o fim da corrida, o título pendia para o lado de Vasser que vinha em 3º. Michael e Al Unser vinham em 9º e 16º, respectivamente, o que deixavam-nos longe do título. Mais à frente, na briga pela liderança, Brian Herta parecia caminhar para o seu primeiro triunfo na categoria, mas na sua cola vinha Zanardi que esperava um momento para tentar o bote apesar de não ter tentado tal manobra. Nessa perseguição o italiano até errara, saindo para fora da pista e voltando ainda em segundo.
Última volta. Brian parecia certo da sua vitória quando freou na entrada do "Saca-Rolha" e começou a contorná-lo normalmente quando um vulto vermelho apareceu ao seu lado. Era Zanardi que havia deixado para frear lá dentro. Seu carro deslizou por dentro e, pelo fato de ter freado tarde demais, seu carro escapara pela estreita linha de asfalto que tinha na parte interna da curva. Ele conseguiu controlar seu Reynard-Honda para que não escapasse para a areia e voltou à frente de Brian Herta, que serpenteava para tentar retomar a liderança. O grande italiano venceu a corrida, a terceira dele naquela temporada de estréia, numa das mais belas e ousadas ultrapassagens dos últimos anos. E não foi apenas na pista que dera o "pulo-do-gato". No campeonato, com a vitória conquistada, saiu de 4º fechou o mundial na segunda posição fazendo a dobradinha da Ganassi com o campeão Vasser.
Essa manobra completou 15 anos no último dia 8 de setembro. E também é um modo de homenagear a conquista de sua maior vitória, que foi de ter sobrevivido ao acidente de sofrera em Lauzistizring há exatamente 10 anos atrás.

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

A nossa incompetência e a competência dos argentinos

Há uma situação aqui no Brasil que posso dizer que aplica-se a todos os esportes: incompetência. Talvez eu seja um pouco radical e apenas o Volêi se salva nesta lista, mas o resto não escapa.
O Brasil teve nos últimos 40 anos 3 pilotos campeões mundiais e uma série de vitória que nos condicionou o status de potência no automobilismo. Claro, era normal você ver um punhado de caras sair daqui com dinheiro contado - o que acontece até hoje - e eles chegarem na Europa e arrebentarem conquistando títulos e mais títulos nas categorias de base. A consequência  foi o sucesso arrebatador que tivemos na F1 neste período.
Pois bem, o que foi feito neste tempo todo para que pudessemos continuar fortes lá fora? Nada. Por aqui as coisas andam à mingua e o resultado é que perdemos uma pancada de corridas nos últimos anos. Primeiro foi a Le Mans Series em 2007, que até onde sei, tinham um contrato de 3 anos com a organização daqui e do nada optaram correr na China em 2008, o que também acabou acontecendo. Talvez tenham rolado algum desentedimento ou sei lá o que for. Agora perdemos a chance de ver provax da F- Super League por aqui, mais precisamente em Goiania e Curitiba. Pois bem, o circuito goiano está em obras e o que mais me deixa impressionado é que essa data já estava marcada há meses e o pessoal nem se mexeu para apressar esses reparos por lá. Aproveitando este atraso a categoria também tirou Curitiba do calendário. E pensar que o FIA GT também correria em Pinhais e e categoria preferiu ir para a China, onde as corridas foram muito boas neste fim de semana passado. Estamos indo ladeira abaixo.
Enquanto perdemos, os nossos hermanos ganham. E como. Não bastassem ter uma etapa do Mundial de Rallye, ainda contam com uma do FIA GT, Rally Dacar e, para 2013, uma etapa da Moto GP será realizada no circuito de Termas de Río Hondo. O melhor de tudo, para eles, é que a reforma deste circuito será bancada pelo governo nacional.
Aí está uma prática muito normal do governo argentino em sua história: apoiar o automobilismo. Desde muito tempo que eles bancam a entrada de seus pilotos no automobilismo internacional, junto da ACA (Automovel Clube Argentino). Foi assim com Juan Manuel Fangio, Oscar Gálvez, José Froilan Gonzalez entre outros noa anos 40/50. E os resultados foram os melhores destes pilotos por lá, em especial com Fangio, que venceu 5 títulos mundiais, com Gonzalez que virou ídolo ferrarista por ter sido o primeiro a vencer com a marca italiana no Mundial em Silverstone, 1951, fora outras grandes vitórias do "Touro dos Pampas". Nos anos 70 foi a vez de Carlos Reutemann receber este apoio e astiar novamente a bandeira argentina na F1. Claro que nunca mais o país teve um piloto na categoria máxima, mas ao menos eles, mesmo que enfrentando crises econômicas bravas, sempre apoiaram o automobilismo em sua base, ou seja, as fábricas. Portanto, mesmo que não tenham pilotos lá fora em chance de chegar na F1, ao menos eles criaram uma condição para os pilotos possam continuar as suas carreiras de modo seguro e claro, caso algum queira se aventurar lá na Europa, o governo e a ACA bancam a parada.
Por aqui continuamos na nossa mazela de sempre; autódromos mal cuidados, dinheiro sendo usado para festas milionárias, viagens, badalações e alguns pilotos que podem garantir uma sobrevida do país na F1, e em outras categorias, continuam negociando corrida à corrida o dinheiro para sobreviverem por lá.
Sim, eles levão e coisa à sério por lá. E pronto.

segunda-feira, 12 de setembro de 2011

GP da Itália - Corrida - 13ª Etapa

Umas das curvas pouco badaladas de Monza é a curva Grande. Contornada a direita é a única feita totalmente com o pé cravado que leva a forte freada da variante Roggia. Ela não chega aos pés da antiga Lesmo, que dependendo do piloto, poderia ser feita de pé embaixo, mas ela tem o seu valor e exige uma dose de coragem para efetuar uma ultrapassagem. E se for por fora, fica ainda mais valorizada. Foi assim que Vettel fez para recuperar a liderança na quinta volta após ter perdido-a para um surpreendente Alonso, que saíra de quarto para primeiro numa largada fenomenal. Vettel havia perdido a liderança não por ter patinado, mas por ter se preocupado em defender-se de Hamilton que o ameaçava por fora e Alonso aproveitou a pequena brecha para assumir a liderança. Um cenário que era um sonho para os tiffosi que ficaram eufóricos. Após a saída do SC, que entrara devido ao strike causado por Liuzzi que levara consigo Rosberg e Petrov e Vettel partiu para o ataque e na quinta passagem ele mostrou que estava amadurecido o suficiente ao aplicar uma ultrapassagem, e passando com as rodas do lado esquerdo na grama, por fora sobre Alonso que nem tivera a chance de se defender-se. Tinha sido uma bela manobra e Vettel mostrara para os seus críticos mais ferrenhos, que ele também sabe ultrapassar quando preciso. Essa manobra, para mim, além de ter sido de total coragem, só serviu para confirmar que ele está amadurecido e que aprendera com os erros do passado. Em outros tempos ele teria ido parar no muro, ou acertado Alonso.
Se Vettel resolveu a sua vida rapidamente, não podemos dizer o mesmo de Hamilton, que protagonizou com Schumacher o mais belo duelo deste ano. Duas gerações de pilotos separados por 16 anos confrontaram-se de um modo franco e aberto: Michael, do alto dos seus 42 anos de pura experiência e sete títulos mundiais nas costas, segurou bravamente Hamilton, que tem a fogosidade dos seus 26 anos e já carrega na bagagem um título mundial e uma coleção infindável de belas ultrapassagens, duelaram por mais de vinte voltas contando as duas vezes em que se encontraram na pista. Michael defendeu-se como pode dos ataques de Hamilton, e em algumas situações, mudou de trajetória mais de uma vez e deu uma fechada de gelar a espinha quando Lewis mergulhou por dentro na curva Grande para tentar a ultrapassagem (antes disso, Hamilton havia feito a ultrapassagem no final da reta dos boxes, mas tomara o troco na curva Grande quando Michael o pegou por fora). Button soube bem aproveitar este momento em que seu companheiro perdera a velocidade para ultrapassá-lo e na mesma volta passar por Schumacher na freada da entrada da Ascari, por fora. O Lewis tentara desde a 4 volta, Button resolveu tudo em meia volta, para ser mais preciso, na 16ª passagem. E dizem que ele soltou pelo rádio “É assim que se faz”, dando uma pequena alfinetada em Lewis. Para o azar do campeão de 2008, ele voltara atrás de Michael logo após sua parada de box na 19ª passagem. Foi outra bela batalha, mas antes que se completassem as 30 voltas, Hamilton conseguiu passar por Schumi na freada da Ascari após Michael ter patinado na saída da segunda de Lesmo. A menor configuração de asa de Schumacher, combinando com a potência do motor Mercedes, lhe deu uma sobrevida nesta batalha pois Hamilton, tendo o mesmo motor, não conseguira passar dele nem mesmo quando usava a asa traseira nas retas. O problema é que Hamilton tinha mais asa que o normal e isso dificultava a sua aproximação. Mas também temos que dizer que Hamilton esteve altamente cauteloso e Schumacher não aliviou em momento algum nas disputas. E isso merece um post à parte.
Com os brasileiros provas distintas: Massa recuperou-se bem do enrosco com Webber após a saída do SC e fez boa corrida de recuperação, o que sugere, caso não tivesse acontecido este incidente, poderia ter brigado até mesmo pela quarta posição. Bruno fez mais um bom trabalho ao ficar em décimo no treino. Escapou da batida na largada, caiu para último, duelou com Kobayashi, Buemi e Maldonado, vencendo todas e chegou na oitava posição marcando seus dois primeiros pontos na F1. Barrichello foi um dos que foram envolvidos na batida da largada e após trocar o bico, voltou no fundo e recuperou-se até a 13ª posição, onde acabou terminando.
Pelo uso da asa móvel e KERS, Monza voltou a ter a sua famosa briga de vácuos, os “Sliptreamers”, que eram comuns quando a pista não tinha as chicanes até 1971. Vettel venceu de modo magistral livrando-se cedo de todas as brigas e sumindo na frente para garantir mais 25 pontos. Agora com 112 de vantagem para Alonso, o novo vice líder, ele pode sair bicampeão já em Cingapura, caso vença a corrida. E a F1 se despede da Europa. E a prova de Monza, no meu ver, deixará saudades principalmente quando vermos por onde a F1 vai correr até o final do ano nos circuitos insossos da Ásia e Oriente Médio. Mas para compensar, ainda teremos Suzuka e Interlagos, duas pistas onde, normalmente, os homens se separam dos garotos. 
A Largada: Alonso se prepara para dar o bote em Hamilton e Vettel
 Liuzzi veio varrendo quem estava na frente e levou Rosberg e Petrov consigo. Em Cingapura perderá 5 posições, mas na verdade um gancho de uma corrida seria bom ele aprender a não estragar a corrida dos outros
O grande duelo: Schumacher fez de tudo, e mais um pouco para defender-se dos ataques de Hamilton...
...até que Button e resolveu a ladainha em meia volta, passando os dois contendores
Bruno marcou seus dois primeiros pontos na F1 e teve boas disputas com Buemi e Kobayashi, acima

RESULTADO FINAL
Grande Prêmio da Itália
Circuito de Monza- 13ª  Etapa- 11/09/2011
53 voltas

1. Sebastian Vettel (ALE/Red Bull-Renault) - 1h20min46s172
2. Jenson Button (GBR/McLaren-Mercedes) - a 9s590
3. Fernando Alonso (ESP/Ferrari) - a 16s909
4. Lewis Hamilton (GBR/McLaren-Mercedes) - a 17s417
5. Michael Schumacher (ALE/Mercedes) - a 32s677
6. Felipe Massa (BRA/Ferrari) - a 42s993
7. Jaime Alguersuari (ESP/Toro Rosso-Ferrari) - a 1 volta
8. Paul di Resta (ESC/Force India-Mercedes) - a 1 volta
9. Bruno Senna (BRA/Lotus-Renault) - a 1 volta
10. Sébastien Buemi (SUI/Toro Rosso-Ferrari) - a 1 volta
11. Pastor Maldonado (VEN/Williams-Cosworth) - a 1 volta
12. Rubens Barrichello (BRA/Williams-Cosworth) - a 1 volta
13. Heikki Kovalainen (FIN/Team Lotus) - a 2 voltas
14. Jarno Trulli (ITA/Team Lotus) - a 2 voltas
15. Timo Glock (ALE/Virgin-Cosworth) - a 2 voltas

Não completaram a prova:
Sergio Perez (MEX/Sauber)
Daniel Ricciardo (AUS/Hispania)
Kamui Kobayashi (JAP/Sauber)
Adrian Sutil (ALE/Force India)
Mark Webber (AUS/Red Bull)
Jerome D'Ambrosio (BEL/Virgin)
Vitaly Petrov (RUS/Lotus Renault)
Nico Rosberg (ALE/Mercedes)
Vitantonio Liuzzi (ITA/Hispania)

FOTOS: ITV.COM

sábado, 10 de setembro de 2011

GP da Itália- Classificação- 13ª Etapa

Foi um treino simples, direto, sem toda aquela emoção que foi a de Spa, 15 dias atrás. Vettel não teve muito trabalho para conseguir a pole e até melhorou no final da Q3 seu tempo que era ótimo e colocou nas costas de Hamilton, mais de 4/10 de segundo. Uma maraca respeitável, mas que confesso, que não fará nenhuma diferença amanhã quando largarem.
O que me leva a ter essa idéia é que os carros prateados estarão em melhor condição, visto que suas performances em corridas neste ano estiveram próximas dos rubro-taurinos e Hamilton foi muito bem na sexta, dia que as equipes procuram acertar o carro para a corrida. E se não bastasse Hamilton ao seu lado, logo atrás aparece Button que tem sido destaque nas últimas corridas devido suas recuperações baseadas em estratégias e também, claro, em boa dose de velocidade. Então vejo uma corrida acirrada enre estes três.
Alonso aparece em quarto e, mesmo que a Ferrari tenha bom desempenho em condições quentes, como tem estado a temperatura de Monza nestes dias, não o vejo com grandes condições de chegar ao pódio e a sua batalha pela quarta posição, de início, ficará restrito a Webber (5º) e possivelmente Massa. As Mercedes também podem aparecer nesta briga no decorrer da corrida, mas isso vai depender se conseguirem superar rapidamente Petrov que conseguiu uma boa volta e sai em 7º (Schumacher sai em 8º e Rosberg 9º).
Senna também fez bom trabalho nas duas primeiras partes ao conseguir ficar entre os dez primeiros e preferiu não treinar na Q3 para economizar pneus moles para amanhã. Barrichello fechou em 13º.
Portanto a corrida de amanhã ficará restrita a uma briga entre a Red Bull de Vettel contra os Mclarens de Hamilton e Button. E nisso aposto numa vitória de uma das Mclarens, já que Vettel não é o melhora carro de reta em Monza.

RESULTADO FINAL- GRID DE LARGADA PARA O GP DA ITÁLIA- 13ª ETAPA

1 Sebastian Vettel (ALE/Red Bull) - 1mnin22s275
2 Lewis Hamilton (ING/McLaren) - 1min22s725
3 Jenson Button (ING/McLaren) - 1min22s777
4 Fernando Alonso (ESP/Ferrari) - 1min22s841
5 Mark Webber (AUS/Red Bull) - 1min22s972
6 Felipe Massa (BRA/Ferrari) - 1min23s188
7 Vitaly Petrov (RUS/Lotus Renault) - 1min23s530
8 Michael Schumacher (ALE/Mercedes) - 1min23s777
9 Nico Rosberg (ALE/Mercedes) - 1min24s477
10 Bruno Senna (BRA/Lotus Renault) - Sem tempo
11 Paul Di Resta (ESC/Force India) - 1min24s163
12 Adrian Sutil (ALE/Force India) - 1min24s209
13 Rubens Barrichello (BRA/Williams) - 1min24s648
14 Pastor Maldonado (VEN/Williams) - 1min24s726
15 Sergio Perez (MEX/Sauber) - 1min24s845
16 Sebastien Buemi (FRA/Toro Rosso) -1 min24s932
17 Kamui Kobayashi (JAP/Sauber) - 1min25s065
18 Jaime Alguersuari (ESP/Toro Rosso) - 1min25s334
19 Jarno Trulli (ITA/Lotus) - 1min26s647
20 Heikki Kovalainen (FIN/Lotus) - 1min27s184
21 Timo Glock (ALE/Virgin) - 1min27s591
22 Jerome D''Ambrosio (BEL/Virgin) -1min27s609
23 Daniel Ricciardo (AUS/Hispania) - 1min28s054
24 Vitantonio Liuzzi (ITA/Hispania) - 1min28s231

FOTO: GETTY IMAGES

quinta-feira, 8 de setembro de 2011

Uma visão da F1 por José Carlos Pace, 1975

“Como tudo na vida, o automobilismo evoluiu muito nos últimos tempos. Naturalmente se tornou mais profissional, mas principalmente muito mais competitivo a todos os níveis. Com este profissionalismo e este aumento de competição e de luta, criou-se uma atmosfera bem diferente. Note-se que se o profissionalismo não tivesse aumentado e melhorado, não teríamos chegado ao ponto ao que chegamos atualmente. Poderia mesmo ser dito que nunca automobilismo esteve tão bem como agora. Claro que tem os seus problemas. Claro que existem alguns crápulas que tornam esta profissão bastante ingrata, uma profissão em que só contam os que estão por cima pois quando você está por baixo todo o mundo o tenta pisar e machucar. No fundo há uma espécie de máfia. Eles procuram tirar tudo sem dar nada em troca. Quem são eles? É todo o pessoal que está envolvido no automobilismo: construtores, chefes de equipe e inclusive pilotos. Estes últimos devido à falsidade com que atuam muitas vezes uns para com os outros, procurando apenas defender seus interesses exclusivos, sem se importarem com os outros. Muita gente olha para os atuais pilotos de Fórmula 1 como sendo os heróis de estórias em quadrinhos. Não são nada disso. Há muita falsidade em todo circo da F1.”
Esse comentário feito por José Carlos Pace em 1975 para o anuário “Motores 75/76” do Francisco Santos, mostra o quanto que a F1 e o automobilismo em geral, já naquela época em que os valores humanos ainda contavam muito, havia mudado.
É interessante você observar esta declaração e ver que o automobilismo, em suas entranhas, é um poço extremamente escuro e nojento que vem de muito tempo atrás. E eu credito isso ao dinheiro que começou a ser injetado em doses cavalares exatamente naquela época, quando as empresas de cigarros disputavam cada milímetro dos carros para estamparem seus logos. Com muito dinheiro em jogo ficava mais fácil de um tentar puxar o tapete do outro em causa própria. E isso perdura até hoje: nos anos 80 até início dos anos 90, muitos picaretas se aproveitaram da F1 para lavar dinheiro e estes, em alguns casos, foram presos e até mortos em perseguições de polícia. Sobre os pilotos, também é uma raça complicada e hoje, graças ao "boom" que a internet teve no final dos anos 90, ficou muito mais fácil de conhecê-los e ver que realmente não eram, ou são, os heróis que pensávamos.
E passados 36 anos ainda continua atual e, quanto mais você ler este comentário, verá que ele se encaixa muito bem na F1 de hoje.

segunda-feira, 5 de setembro de 2011

Entrevista: Bernie Ecclestone, Quatro Rodas- Fevereiro de 1977

Esta entrevista foi publicada na edição de fevereiro de 1977 da Quatro Rodas e nela, Bernie Ecclestone fala sobre o seu início no automobilismo, sobre a Brabham, Carlos Pace, a Associação dos Construtores e também sobre a crise do petróleo e a futura chegada dos motores turbos à F1:


Ele é considerado o homem forte da Fórmula 1. Proprietário da equipe Martini-Brabham, esse inglês (1,60 de altura), no entanto, não se acha tão poderoso quanto dizem, embora a cada dia consiga ser ainda mais respeitado.
A fama de ser “o dono do circo” ele ganhou por suas participações como presidente da Associação dos Construtores de Fórmula 1, sempre decidido, muito atuante- talvez até mais do que em sua própria equipe- onde até já delegou grandes poderes a Gordon Murray e Carlo Chitti.
É que Bernie Ecclestone, 43 anos, é mais um homem de bastidores. Prefere fazer os acertos nos corredores dos hotéis do que resolver qualquer coisa nas pistas dos autódromos. É muito temido pelos organizadores de Grandes Prêmios por sua coragem altamente contrastante com sua altura e, sempre que se vê no direito, está desafiando a FIA. Faz questão de receber o dinheiro correspondente à Associação dos Construtores dois meses antes da corrida, para fazer a partilha entre os sócios de acordo com a importância de cada equipe e a fama de seus pilotos.
As corridas sempre fizeram parte da vida de Bernie Ecclestone. Aos 16 anos, já tocava moto; depois, tornou-se piloto de carro. Mas ele mesmo viu que não levava jeito. Virou manager e, já em 1960, destacou-se com sua equipe de Fórmula 2, onde despontava Jochen Rindt. Passou para a Fórmula 1, ainda na Lotus, e foi levado por Graham Hill para a Brabham, que acabou comprando.

Quatro Rodas – Quem é você?
Bernie EcclestoneNão sou muito alto, como você pode ver. Tenho 43 anos e nasci em St. Peters Suffolk, na Inglaterra. Trabalho sete dias por semana, 16 horas por dia, na minha equipe, Martini-Brabham, e também como presidente da Associação dos Construtores de Fórmula 1. Não me considero um homem poderoso na Fórmula 1, como muitos pensam. Apenas sou um dos que trabalham mais com vontade.

QR – Como você começou?
BEEstou ligado às corridas há muitos anos. Antes de entrar para a Fórmula 1, eu corri de moto e automóveis, até me dedicar somente a dirigir equipes. Comecei a correr com 16 anos, após abandonar os estudos para participar de competições de mototrial (uma categoria parecida com o Motocross) e velocidade. Em 1958, juntamente com Tim O’Connors, montei uma fábrica de motocicletas e participamos de várias corridas, até que ele resolveu partir para outros negócios. Eu continuei a competir de moto, mas resolvi experimentar o automobilismo. Foi uma experiência curta, pois sofri um acidente em Brands Hatch e parei por algum tempo. Depois de dois anos comprei um Cooper Bristol 2000 para fazer algumas corridas, mas acabei descobrindo que não tinha talento para isso. Como não queria ficar fora do ambiente, do que gosto muito, resolvi me dedicar à carreira de manager. Minhas primeiras experiências nessa nova atividade ocorreram em 1957/58, quando comprei uns Connaughts e contratei os pilotos Stewart Lewis Evans, Roy Salvadori, Archie Scott e Ivor Bueb. Conseguimos algum sucesso, mas Evans acabou morrendo num acidente e novamente me afastei das corridas. Voltei em 1960, como manager de Jochen Rindt na equipe Lotus de Fórmula 2. Fiquei na Lotus vários anos, até ser convidado por Graham Hill para ser seu manager na Brabham, em 1971. Logo depois, Jack Brabham me vendeu a equipe e estou com ela até hoje. Em resumo, é isto.

QR – Você sempre esteve ligado aos motores Ford Cosworth na Fórmula 1. Por que a mudança para s Alfa em 1976?
BE Enquanto os Ford Cosworth foram competitivos, estive com eles. Com o domínio da Ferrari com seus motores de 12 cilindros em 1975, começamos a pensar seriamente num novo motor. A Alfa Romeo mostrou ter um motor competitivo no Campeonato Mundial de Marcas e experimentá-lo na Fórmula 1 seria uma solução para combater a Ferrari. Fizemos um acordo comercial com a Alfa Romeo, mas confesso que tivemos muitos problemas na temporada passada, pois estes motores não se mostraram muito eficientes. Mas sabia que pesquisando e investindo conseguiríamos sucesso, como está ocorrendo no início desta temporada. A Alfa Romeo, através de seu engenheiro Carlo Chitti, contribuiu bastante em pesquisas com o motor, que se tornou mais leve com o uso de ligas espaciais de magnésio nas peças não sujeitas ao esforço, além de diferentes tipos de admissão e escapamento. De nossa parte, o Gordon Murray pesquisou novos materiais para diminuir o peso do carro, que agora é um dos mais competitivos da Fórmula 1.

QR – Um dos problemas da equipe no ano passado não foi com os mecânicos, já que os italianos mexiam apenas nos motores e os ingleses nos chassis?
BE - Efetivamente tivemos alguns problemas nesse setor. Quando o carro parava nos boxes, era difícil entender o motivo, pois a mistura de línguas era muito grande. Eu particularmente tive um trabalho redobrado. Porém, tanto os italianos como os ingleses são ótimos mecânicos e o que faltava era um melhor entrosamento. Este ano o problema está totalmente resolvido, pois o Gordon Murray e o Carlo Chitti estão trabalhando com bastante afinidade.

QR – Para deixar o carro competitivo, qual o investimento feito na equipe?
BEAlém de uma série de pesquisas, treinos e outras coisas, partimos para a construção de um carro totalmente sofisticado. Nosso maior problema era o peso do chassis, principalmente no início da corrida, quando largava com os tanques cheios, com maior quantidade de combustível do que os outros carros. A solução para diminuir o peso do chassis sem tirar-lhe a robustez, foi utilizar titânio, material muito resistente a altas temperaturas e , o que é mais importante, muito leve. Entretanto, esse material, muito utilizado na construção de foguetes e naves espaciais, é caríssimo e, por isso, gastamos 1,5 milhões de dólares para construir dois carros. Ao mesmo tempo, a Alfa Romeo desenvolvia o motor, com menor peso. Pesquisamos bastante também a parte aerodinâmica do chassis e freios, utilizando, pela primeira vez no setor automobilístico, freios com pastilhas em fibra de carbono, do mesmo tipo dos usados nos aviões Concorde.

Estranho prejuízo

QR – Compensa manter uma equipe de Fórmula 1? Ganha-se dinheiro com ela?
BE – O investimento feito numa equipe é quase 10 vezes maior do que o que arrecadamos com patrocínio e prêmios. Eu não estou na Fórmula 1 para conseguir lucros nem ficar rico, para isso tenho meus próprios negócios particulares. Mantenho uma equipe porque gosto muito do automobilismo e continuarei investindo enquanto o que faço me der uma satisfação pessoal.

QR – Como vê a nova associação, a World Championship Association, presidida por Patt Duffeler?
BE Não a conheço. Não temos nenhuma negociação com essa associação.

QR – Mas vocês tiveram problemas com essa associação, principalmente em relação ao GP da Argentina.
BE É difícil explicar isso, até mesmo para vocês. Essa associação é a terceira a ser fundada nos últimos anos e o seu objetivo é arrecadar dinheiro dos organizadores para fazer os GPs. Ora, por que pagar a eles se os organizadores já realizam os GPs tendo sua própria infra-estrutura? Nossa associação cuida dos interesses dos construtores, as demais estão interessadas apenas na parte comercial das corridas.

QR – Como surgiu a Associação dos Construtores de Fórmula 1?
BEA Associação existe há muitos anos e foi fundada com o objetivo de reunir todas as equipes participantes da Fórmula 1, tentando diminuir as despesas com transporte, contatos com organizadores e para atuar junto à FIA nas decisões referentes ao Campeonato Mundial de Pilotos.

QR – Mas parece que somente nos últimos anos a Associação está mais atuante e respeitada?
BERealmente, agora temos a força de uma verdadeira associação de classe. Parece que todos estão satisfeitos com meu trabalho, porque eu procuro defender o interesse de todos, não apenas os meus. Estou fazendo justamente aquilo que todos precisam e continuo na presidência porque acho que nossa união é importante e parece que estou conseguindo isso. Até mesmo os organizadores de GPs estão satisfeitos com meu trabalho, por isso pretendo continuar lá.

QR – Por que Carlos Reutemann saiu da equipe Brabham?
BE – É um cara gozado o Reutemann. Eu não acredito que ele se entendesse bem com José Carlos Pace. É o tipo de pessoa que não gosta muito de ajudar os colegas, como pace faz, e por isso o brasileiro começou a encará-lo de forma diferente. Estava insatisfeito, reclamando muito do dinheiro que recebia e do desempenho do carro, mas não poderia deixar a equipe porque tinha um contrato a cumprir por dois anos. Mas a situação chegou a tal ponto e o ambiente na equipe era tão ruim que resolvi liberá-lo. Era o que ele queria, ir embora.

QR – E por que o Alex Dias Ribeiro não foi contratado, já que iniciaram entendimentos?
BE Esse menino fez boas coisas na March no Campeonato de Fórmula 2, mas não sei quem o convidou para a equipe. Apenas o Pace veio me dizer que não custaria nada experimentá-lo num dos carros. Concordei porque o Pace me pediu, mas não sei os motivos de seu afastamento de nós assinando com a March para a F1.

Elogio a Pace

QR – Como você vê o José Carlos Pace?
BEEle tem tudo que um campeão precisa. É uma boa pessoa, trata todo mundo bem, dedicando muito tempo aos mecânicos e demais membros da equipe, por isso todos gostam muito dele. Pra mim é autêntico corredor de primeira classe e acredito que será um excelente campeão, ainda este ano. Na minha opinião, sua principal virtude é a vontade de lutar. Como dizem vocês no Brasil: tem muita garra.

QR – E o Watson?
BEEle é imprevisível, um maluco. Posso dizer isso porque já pilotou para mim em 1970/71 na Fórmula 2 e em 1973 na Fórmula 1, com um Brabham semi-oficial. Gosto muito dele e ele se abre muito comigo, indo sempre à minha casa para fazer confidências. Conversamos sobre vários assuntos nessas reuniões, menos corridas. É um piloto muito veloz e isso é muito bom para nossa equipe.

QR – Você acha que a crise mundial do petróleo poderá acabar com a F1?
BE Eu não acredito nisso.

QR – E no Brasil, acha que a s corridas nacionais irão terminar?
BETambém não acredito nisso. É só o Governo voltar dois anos e ver que na Europa superamos essa crise sem diminuir ou sacrificar as corridas dos calendários. O consumo de combustível numa temporada automobilística é irrisório. Uma prova de Fórmula 1, por exemplo, que tem 320 quilômetros de distância, mais os treinos e classificações, gasta tanto quanto um Jumbo correndo numa pista para levantar vôo. Outra coisa: as corridas são transmitidas pela TV e muitas pessoas ficam em casa, economizando gasolina. O Grande Prêmio do Brasil de Fórmula 1 fez com que o país fosse colocado no Mapa Mundi e não ficasse conhecido apenas pelo Emerson. O Brasil tem uma dos quatro melhores pilotos do mundo e isso abre muitas janelas. Outra coisa, o Brasil tem ótimos circuitos em muitos novos pilotos podem ser revelados, o que já não acontece tanto nos países europeus, fora Inglaterra, França e Itália. Não acredito que no Brasil as corridas sejam proibidas, porque seria a mesma coisa que proibir as pessoas de assistir a uma partida de futebol no estádio.

QR – Se o Brasil proibir corridas nacionais, perde o direito de realizar o GP?
BELógico que perderia, pois se um país não tem corridas internas, não tem o direito de pretender uma data no calendário da Fórmula 1, pois outros países também estão interessados em realizar seus GPs. A partir dessa ano, mesmo que por um ano, perderá sua data e nunca mais a reaverá. Na minha opinião, se o mundo, em particular a Europa, vir que o Brasil não realiza mais corridas devido ao problema de combustível, verá que o Brasil está com crises internas econômicas, já que eles também tiveram esse problema e não cancelaram as corridas pois encontraram uma solução.

QR – Como vê a entrada dos motores turbo na Fórmula 1?
BENão será possível admitir motores turbo na Fórmula 1, porque teríamos que fazer uma modificação total nos regulamentos, utilizar outro tipo de combustível, mais complicado. E, por favor, acredite-me, não há possibilidades. A utilização do motor turbo nos protótipos é diferente, porque tem outro coeficiente de cilindrada 2.200cc com turbo para elevar para 3.000, enquanto que na Fórmula 1 os motores turbo têm que se ter apenas 1.500cc. Fui assistir a uma competição com carros turbo e a diferença de potência entre eles é muito grande, não havendo competitividade. A Porsche tentou uma vez utilizar um motor turbo e não deu certo. Acredito que não temos nada mais avançado que os atuais motores da Fórmula1.

QR – Os atuais regulamentos das competições devem ser modificados?
BEPrincipalmente na parte de segurança dos circuitos. Estamos em reuniões permanentes com a FIA tratando destes assuntos. Outra coisa importante que deve ser feita pela FIA e que não está sendo feita é com relação ao cumprimento das leis. Não existe uma pessoa destacada pela FIA para observar os limites estabelecidos pelos carros com uniformidade durante toda a temporada. Foi por isso que tivemos vários problemas na temporada passada, com desclassificações de carros e outras coisas. Mas temos muitas sugestões para fazer à FIA, principalmente com relação a limitações impostas aos carros.

QR – A FIA é encarada como inimiga da Associação?
BEA FIA tem uma política muito complicada, que nós não queremos entender. Fazemos nosso trabalho pela Associação e, por enquanto, a FIA não está nos incomodando.

Textos e fotos: Roberto Ferrerira (Quatro Rodas)

Quero agradecer ao José Carlos Chaves, editor sênior da revista Quatro Rodas, por ter permitido a reprodução, em sua totalidade, dessa entrevista com Bernie Ecclestone. 
Aqui fica o meu  muito obrigado por essa oportunidade.

Foto 1042 - Uma imagem simbólica

Naquela época, para aqueles que vivenciaram as entranhas da Fórmula-1, o final daquele GP da Austrália de 1994, na sempre festiva e acolhedo...