O ano de 1974 para o automobilismo e
indústria automobilística não foi dos melhores. Foi uma época que a visão neste
campo automobilístico – englobando as duas frentes – teve que ser repensada e
ajustada conforme a mudança dos ventos que a Crise do Petróleo, deflagrada ao
final de 1973 com a Guerra de Yom Kippur que fez os barris de petróleo subirem
de preço de forma estratosférica - até 400% -, proporcionou a toda economia mundial.
Enquanto que as grandes fábricas repensavam o modo de construção dos carros,
numa forma onde estes novos veículos pudessem ter um bom desempenho mantendo um
baixo consumo, as competições tiveram que reduzir drasticamente – ou nem tanto
assim – as distâncias a serem percorridas em algumas etapas – ou todas –
visando uma economia global em seus respectivos certames.
O Campeonato Mundial de Marcas e o Mundial
de Ralis foram o que mais sofreram com essa redução, ainda assim que o de
Marcas foi ligeiramente melhor, tendo apenas as provas de Nurburgring e Paul
Ricard reduzidas dos tradicionais 1000Km para 750Km. Nos Ralis, todas as etapas
tiveram reduções nas distâncias e para 1975 seria previsto o fim de provas mais
“velozes”, o que foi um pretexto para que autoridades não interferissem nessa
modalidade. Na Europa, o campeonato que mais sofreu com as restrições foi o
Europeu de Turismo que abrigava os lendários e belos BMW CSL e os Ford Capri
além, claro, do Ford Escort, que levou o título da competição naquele ano. As
duas principais fábricas tiveram que rever o seu programa de competição, porém
não foram tão afetadas assim e puderam manter uma disputa direta entre elas,
sem a interferência de uma terceira concorrente.
Nos EUA, com a sua característica habitual
de alto consumo devido aos seus motores beberrões, a crise pegou pesado por
aquelas bandas, mas quem se saiu bem nisso, mesmo tendo que cortar algumas
provas de seu calendário em dez por cento – a distância delas, no caso – foi a
NASCAR que ainda precisou reduzir o tempo das qualificações. Mas estas medidas
não afetaram o grande campeonato. A Indy teve sérias mudanças no âmbito da
segurança e isso foi de encontro à crise do petróleo, onde a quantidade de
combustível foi regulada para cada competidor, tanto em treinos quanto em
corridas. A Can-Am começou a ver a sua derrocada exatamente nesta época, quando
a limitação do combustível passou a vigorar – tanto que a Porsche retirou o seu
“canhão” 917/30 de linha exatamente por causa do racionamento.
Aqui no Brasil foi possível ver a chegada
da Fórmula Super-Vê que logo de cara fez um tremendo sucesso com o seu torneio,
realizado entre setembro e dezembro de 1974 num total de seis provas – Goiânia,
Brasília, São Paulo (duas vezes), Porto Alegre e Cascavel. Marcos Troncon foi o
primeiro campeão da Super-Vê, com um ponto de vantagem sobre Francisco Lameirão
(20x19). Foi nesse período que outros dois nomes do automobilismo brasileiro
passava a ganhar forma, exatamente por causa de suas exibições na Super-Vê:
Ingo Hoffman e Nelson Piquet.
Na Fórmula-1, que iniciava a 25ª temporada
de sua história, as mudanças mais significativas estavam nos cockpits das
equipes. A grave crise não havia afetado totalmente a categoria, mas as equipes
não apresentaram grandes evoluções técnicas em seus carros, excetuando a
Ferrari, Lotus e Tyrrell – para mencionar as grandes – que apresentaram novos
carros, as demais continuaram, ou apresentaram evoluções dos bólidos usados em
1973. Porém, o que deve ser destacado nessa temporada, foi o retorno da Ferrari
ao topo das vencedoras após uma terrível crise técnica que fez a equipe de
Maranello ficar de fora de algumas provas de 1973 para que isto fosse resolvido
por Mauro Forghieri – num meio tempo, Mauro foi afastado após seu fracasso na
construção da Ferrari 312 B3 “Spazzaneve” e substituído por Colombo e John
Thompson, que não conseguiram dar liga ao novo B3 e com isso Forghieri foi
chamado de volta. Niki Lauda mostrou a sua classe que já havia sido muito bem
vista nos seus tempos de BRM, e junto da Ferrari, formaram um conjunto
fortíssimo que só não foi campeão mundial por causa de baixa confiabilidade do
equipamento. Jody Scheckter foi outro que mostrou qualidades e agora com um
carro competitivo e a sua agressividade domada, pôde mostrar o seu valor. José
Carlos Pace foi outro que conseguiu o seu lugar no sol da categoria, ao
apresentar boas performances pela equipe Surtees que pouco lhe podia oferecer e
isso fez com que o desgaste fosse aumentando a ponto de ocorrer uma separação
por ambos os lados, com Pace indo se juntar a outro Carlos, o Reutemann, na
Brabham e naquele local ele pôde mostrar do que era capaz. Outros dois pilotos
que também mostraram as suas virtudes apareceram naquela temporada: James Hunt
e Tom Pryce eram as novas apostas do automobilismo britânico e as suas atuações
passaram a ser bem vistas e era apenas uma questão de tempo para que virassem
grandes astros da categoria. Apesar de todos estes destaques, foi Emerson
Fittipaldi que confirmou a sua genialidade ao dar para a McLaren o seu primeiro
campeonato mundial de pilotos, oito anos após a estréia da equipe de Bruce
McLaren na F1. Para ele foi o segundo mundial e talvez o mais suado, uma vez
que o M23 não era um carro tão bom quanto o 312 B3 da Ferrari, mas que tinha um
trunfo a seu favor que era a confiabilidade que acabou sendo vital para a
conquista de Emerson.
Como havia dito antes, as grandes novidades
provinham apenas nas mudanças de pilotos e a parte técnica ficando em segundo
plano, sem grandes novidades.
Tyrrell 007 |
Lotus JPS 76 |
Mclaren M23 |
Iniciando a temporada com os trabalhos de
Carlos Reutemann e Richard Robarts (que mais tarde seria substituído por Rikki
von Opel, que também daria lugar a José Carlos
Brabham BT44 |
Hesketh 308 |
Ferrari 312 B3 |
BRM P201 |
Shadow DN3 |
Surtees TS16 |
Iso-Marlboro FW1 |
March 741 |
Embassy Hill Lola T370 |
A Ensign de Morris Nunn até que podia vislumbrar algo melhor para 1974 devido a sua parceria com Rikki von Opel, que
financiava o projeto. Mas desgaste nas relações entre as duas partes, deixou a
Ensign sem um apoio financeiro e que foi rapidamente reabilitado com a chegada
do milionário chinês Tedd Yip. Vern Schuppan (depois Mike Wilds é quem
pilotaria o carro no restante do mundial) assumiu o comando do N1/74, mas Yip
também sairia em breve da parceria. Sem dinheiro suficiente, o desenvolvimento
do N1/74 ficou atrasado.
Outras sete equipes também fizeram suas
aparições durante aquela temporada, mas de forma esporádica: a Token, equipe
qual Tom Pryce fez a sua estréia na F1, alinhou em três GPs naquele ano, sendo
uma com Pryce (Bélgica) e duas com Ian Ashley (Alemanha e Áustria) e uma não
classificação com David Purley, em
Brands Hatch. O Trojan, desenhado por Ron
Tauranac, até que apresentou boas performances nas mãos de Tim Schenken durante
a fase européia – já que o orçamento da equipe era limitado e não podiam viajar
para as corridas fora do velho continente. Mas ao menos o carro era confiável e
seu não deu oportunidades de Schenken marcar pontos, ele terminou um bom número
de provas. O Lyncar nem pôde ser avaliado por inteiro, pois o único GP em que
tentou se qualificar foi o da Grã-Bretanha e John Nicholson não obteve sucesso.
Chris Amon também montou a sua equipe, mas foi
pouco feliz já que o carro
projetado por seu amigo John Dalton tinha sérios problemas nos freios. O Maki,
equipe oriunda do Japão, também apareceu pouco durante o ano e nos GPs que se
fez presente não qualificou-se e Howden Ganley era quem pilotava o carro.
Outras duas equipes que fizeram sua estréia na categoria foram a Parnelli e
Penske durante as duas corridas na América do Norte. E na verdade eles já
estavam se preparando para 1975, quando fariam a temporada completa.
O Token RJ02 |
O Maki F101 com Holden Ganley |
O início arrebatador da McLaren e a confirmação da Brabham
A Fórmula-1 abriu seus trabalhos no dia 13
de janeiro na pista de Buenos Aires, debaixo do típico – e forte calor – do
verão argentino. Autódromo lotado, como sempre, afinal os argentinos são
fascinados por automobilismo, mesmo que não haja nenhum piloto local. O que não
era o caso: Carlos Reutemann estava em grande forma naquele fim de semana numa
pista que ele tão bem conhece, mas na classificação ele conseguira apena o
sexto melhor tempo. A pole foi de Ronnie Peterson, extraindo o máximo de sua
velha Lotus 72 num momento que a posição de honra parecia estar destinada à
Regazzoni, que sairia em segundo. Emerson Fittipaldi se posicionou num bom
terceiro lugar, tendo ao seu lado Peter Revson. Carlos Pace marcara o 11º
tempo.
Juan Manuel Fangio foi o responsável pela
largada e no baixar da bandeira, Reutemann costurou os primeiros colocados para
se posicionar em segundo. Emerson continuou em terceiro e Regazzoni envolveu-se
num acidente na primeira volta com Revson, o que deixou o piloto americano logo
de fora. Jarier também acabou batendo em Peter e também abandonou. Um péssimo
dia para a Shadow, que
perdera seus dois carros numa tacada só. Clay continuou
na prova após cair para 20º, mas recuperou-se a tempo de garantir uma terceira
colocação.
Reutemann, que havia ultrapassado Peterson
na terceira volta, estava prestes a vencer a sua primeira corrida oficial na
Fórmula-1 quando o sistema de alimentação do Brabham passou a apresentar
problemas, não conseguindo puxar a gasolina. Isso resultou numa brusca queda de
rendimento que possibilitou a fácil chegada e ultrapassagem de Denny Hulme pelo
Brabham, faltando três voltas para o fim. Um tremendo presente para o veterano
neozelandês. Carlos continuou se arrastando pela pista e, devido a enorme
diferença que construíra durante a corrida, ainda encontrava-se em segundo na
penúltima volta, mas a gasolina acabaria de vez e o piloto argentino ficaria de
vez pelo caminho numa frustrante sétima posição. Emerson estava numa boa terceira
posição até, acidentalmente, esbarrar na chave geral do M23. O carro desligou e
Fittipaldi ficou de fora do GP. Para as próximas corridas, por precaução, a
chave foi cortada ao meio.
Além de Denny, Lauda, Regazzoni, Hailwood,
Beltoise e Depailler, fecharam os seis primeiros. Pace abandonou a corrida na
21ª volta com problemas na suspensão de seu Surtees.
Interlagos foi o palco da segunda prova
daquele ano. Emerson começou de forma eletrizante, ao levar o público ao
delírio com a obtenção da pole. Ao seu lado, um astuto Carlos Reutemann, que
além de mostrar as qualidades do BT44, também queria recuperar a vitória
perdida em Buenos Aires. A terceira posição era de Peterson, com Lauda em
quarto. Na quinta posição, Jacky Ickx e em sexto Peter Revson. Pace marcara o
12º tempo.
Emerson caiu para terceiro na largada, com
Reutemann assumindo o primeiro posto e Peterson o segundo. Mas as três
primeiras voltas foram de um duelo tremendo entre os três pilotos, o que fez os
pneus de Carlos se desgastar rapidamente. Peterson e Emerson subiram uma
posição após passarem pelo piloto argentino, e logo se distanciaram. Até a 16ª
volta foi uma perseguição implacável de Emerson sobre Ronnie, mas o sueco foi
para os boxes trocar um dos pneus que acabou furando. O maravilhoso duelo havia
acabado e agora Fittipaldi estava tranquilamente na ponta da corrida, até que
entre a volta 29 e 30 um temporal caiu no traçado paulistano encharcando toda a
pista. A direção de prova decidiu encerrar a corrida na volta 31, de um total
de 40. Emerson chegava a sua primeira vitória no ano, assim como a primeira
pela McLaren e a segunda consecutiva em Interlagos. A segunda posição foi
conquistada por Regazzoni, mostrando mais uma vez a boa evolução da 312 B3, em
terceiro Ickx, quarto Pace, quinto para Hailwood e sexto para Peterson. No
campeonato de pilotos, Clay Regazzoni aparecia liderando com 10 pontos; Hulme e
Emerson Fittipaldi computavam 9 pontos cada na segunda e terceira posições; em
quarto Niki Lauda com 6 pontos; em quinto Hailwood com 5 pontos e em sexto
Ickx, com 4 pontos.
Antes que a terceira etapa – o GP da Áfricado Sul – fosse realizada, as equipes realizaram testes coletivos em Kyalami. E
foi nestes testes que Peter Revson teve o seu acidente mortal, após escapar na
curva Barbeau e ir de encontro ao guard-rail. A Shadow não participou do GP, em
respeito à memória de Revson. A corrida foi realizada um mês depois após o
governo local suspender as provas automobilísticas devido à grave crise do
petróleo. A segurança naquele circuito também foi muito discutida, mas nada
fizeram para melhorá-la.
Quando a F1 voltou ao circuito
sul-africano, pode-se ver a força da Ferrari através da pole-position de Niki Lauda. Carlos Pace mostrou mais uma vez as suas qualidades e arrancou um
sensacional segundo lugar com o Surtees. No mesmo embalo, Arturo Merzario
também fez um treino espantoso ao colocar o Isso-Marlboro em terceiro, com
Reutemann em quarto. Emerson aparecia em quinto, com Regazzoni em sexto.
A corrida foi uma luta particular entre Lauda
e Reutemann, sendo que o piloto austríaco liderou as dez primeiras voltas do GP
e perdeu a liderança para o argentino, que agüentou bem as investidas de Niki.
Mas as Ferraris, que ocupavam a segunda e terceira colocações até treze voltas
do fim, apresentaram problemas: na volta 65, Clay teve uma falha no motor e
Lauda, há três voltas do fim (75), teve uma pane elétrica. Melhor para Beltoise
e Hailwood, que ocuparam os dois lugares restantes no pódio. Completaram os
seis primeiros, Depailler, Stuck e Merzario. Emerson Fittipaldi não teve um fim
de semana dos melhores, e não passou da sétima posição, enquanto que Pace foi
caindo durante a corrida e fechou em 11º. A Lotus, que estreara o seu JPS 76,
teve um péssimo desempenho e para piorar seus dois pilotos se enroscaram com o
Surtees de Mass e o BRM de Pescarolo ainda no inicio da prova. Isso ocasionou o
abandono de Peterson e um punhado de visitas de Ickx aos boxes, para tentar
regular a asa traseira. Mais tarde o belga abandonaria também.