Os vencedores: a foto da equipe Lotus em 1965, após vencer a Indy 500 daquele ano (Foto: Divulgação) |
Nos dez primeiros anos da Fórmula-1 as 500 Milhas de
Indianápolis fez parte do calendário da categoria num esforço da CSI
(Commission Sportive Internationale) – braço esportivo da FIA que cuidava da F1
e que foi precursora da FISA - em transformar aquele certame em um mundial, uma
vez que a todas as provas que formavam o campeonato eram realizadas na Europa e
por isso a inclusão de uma corrida fora do continente daria ares de Campeonato
Mundial. Apesar da presença da prova no calendário anual da categoria, era como
se ela não existisse: poucas equipes européias e seus respectivos pilotos
atravessavam o Atlântico para competir na famosa prova e isso valia também para
os americanos com relação à Fórmula-1. A prova contava pontos para o campeonato,
mas não valia nada no final das contas.
Em 1952 houve uma tentativa por parte da Ferrari em correr
na Indy 500 daquele ano: uma Ferrari 375 foi destinada a Alberto Ascari, mas
a prova da Scuderia foi pífia. Ascari largou em 19º e abandonou na volta 40 após
um problema em uma das rodas. O desempenho frente aos carros americanos, construídos
especialmente para aquele tipo de corrida, mostrava o quanto de dificuldade que
uma equipe oriunda do velho continente teria. A Ferrari usou como base para a
construção do 375 que competiu em Indianápolis o Tipo 500 que vinha arrasando o
campeonato da F1 e nem mesmo com o DNA da eficiência de seu irmão mais velho,
o Ferrari 375 foi páreo para carros Kurtis (construídos por Frank Kurtis) que
eram impulsionados pelos poderosos motores Offenhauser.
Ao passar a década a F1 começou a expandir os seus horizontes
ao correr em outras praças fora da Europa. A Argentina recebeu o seu primeiro
GP em 1953 e até 1960, a
categoria já havia corrido em Marrocos (que foi palco da decisão do mundial de
1958) e no próprio EUA, com uma corrida realizada no aeródromo de Sebring que a
exemplo do GP marroquino, também abrigou a decisão de 1959. Com a mudança de
regulamentos para 1961, onde os carros passariam a usar motores 1,5 litros, a Indy 500 - onde os motores Offenhauser estavam na casa dos 4,2 litros - foi automaticamente limada do calendário. De toda forma, apesar de não ter sido
bem aproveitada pelas equipes européias, a corrida foi importante para dar o
status de Mundial para a F1 durante aquele período. Ironicamente foi
possível ver um Cooper alinhado para o grid da Indy 500 de 1961, pilotado pelo
então bi-campeão mundial Jack Brabham. O carro nada mais era que um derivado do
T53 utilizado em 1960, mas com pequenas alterações nas suspensões para melhor
curvar à esquerda e o motor, traseiro, foi deslocado também para a esquerda. Era
uma técnica muito usada pelos “Roadsters”, que vinham dominando a prova desde a
segunda metade dos anos 50. O desempenho do pequenino Cooper foi satisfatório:
se ele perdia nas longas retas de Indianápolis, ganhava dos “Roadsters” nas
curvas. Jack marcou o nono tempo (235,13 Km/h) – a pole ficou com Eddie Sachs,
que marcou 237,34 Km/h
– um tempo bem satisfatório, uma vez que o Cooper corria com um motor de 2.7 Litros debitando
255cv, contra os Offenhauser que eram propulsores de 4.2 Litros e 400cv de
potência. Na corrida, que foi vencida por AJ. Foyt após uma batalha épica
contra Eddie Sachs, Brabham levou o Cooper ao nono lugar na classificação
final, terminando na mesma volta do vencedor. Naquela altura, tinha sido a
primeira aparição de um carro com motor traseiro em Indianápolis desde antes da
Segunda Guerra.
A aparição da Cooper na Indy 500 tinha um propósito em
especial: não era apenas o fato de correr e desafiar o poderio americano na
mais famosa corrida da América, mas sim tentar beliscar o bolo maior que era a
premiação. Desde a sua primeira edição em 1911 que a Indy 500 ficou
caracterizada não somente pelas sua altas velocidades, mas também pela grana
que era paga ao vencedor. Ray Harroun, o primeiro vencedor da prova em 1911,
recebeu uma premiação que hoje soa como uma mixaria de U$ 27.550 e em 1961,
cinqüenta anos depois, a premiação havia sido elevada para U$400.000 que foi
embolsada por AJ. Foyt. De certa forma, é um atrativo que foi desperdiçado
pelos teams europeus durante a década de 50 e agora, depois que a F1 se desfez
da corrida, as equipes pareciam ter descoberto o pote de ouro no fim do
arco-íris. Portanto, aquela aparição da Cooper com o seu carro de motor
traseiro acabou por se tornar um passo involuntário que serviu de inspiração
para que o esporte a motor dos EUA, em especial os monopostos, sofresse
profundas transformações durante aquela década. A invasão britânica tinha
atravessado o Atlântico.
O aparecimento avassalador da Lotus no
Brickyard, o apoio da Ford e a vitória de Jim Clark em 1965
Dan Gurney com o Lotus 29 na pista de Indianápolis (Foto: Divulgação) |
Colin Chapman já era um construtor de carros bem sucedido
naquele início dos anos sessenta. Seus carros em categorias menores tinham
grande sucesso e na F1 ele já estava pronto para escalar o topo após algumas
vitórias nas provas oficiais do Mundial. A sua estrela em ascensão, Jim Clark,
estava muito bem naquele mundial de 1962 e viria a perder o campeonato por uma
avaria no motor na prova final, disputada em East London - na África
do Sul - de modo que o título ficou com Graham Hill da BRM. Mas o primeiro
grande sucesso de Chapman havia acontecido em 1958, quando construiu o carro da
equipe Vanwall comandada por Tony Vandervell, que foi campeã de construtores
daquele ano e perdendo por muito pouco o de pilotos com Stirling Moss que ficou a
um ponto de Mike Hawthorn (Ferrari) na classificação final. Além do instinto
apurado para construir carros de corridas, que ficou bem evidente no ótimo
Lotus 25 que ele projetara para Jim Clark e Trevor Taylor naquele ano de 1962,
no que se tornou o primeiro chassi monocoque da categoria, ele também tinha um
tino comercial para arranjar bons contratos e parcerias - que também viria a
transformar a F1 nas décadas seguintes.
Ainda em 1962, Dan Gurney, então piloto da Porsche na F1,
levou Colin para a edição da Indy 500 e os olhos de Chapman brilharam
quando viu a que diferença tecnológica entre a F1 e Indy era enorme, apesar da
alta velocidade alcançada por aqueles “monstruosos” carros. A quantia paga ao
vencedor também aguçou o apetite de Colin Chapman que passou a considerar uma
possível entrada naquela prova para o próximo ano. A chance de encarar o
desafio e vencer os americanos no seu território era o novo objetivo de Colin
Chapman.
Ao final daquela temporada de 1962, quando Clark venceu o GP
dos EUA, disputado em
Watkins Glen, a Ford procurou por Colin para lhe fazer uma
oferta: fornecer motores para a Lotus em sua estadia na Indy 500 do próximo
ano. A grande montadora também tinha interesse em desafiar o poderio da
Offenhauser, que vinha dominando a Indy 500 desde o final dos anos 30 e para isso
passou a trabalhar no desenvolvimento do motor do Ford Falcon, além de inúmeras
conversas com outros projetistas que trabalharam nos últimos anos das 500 Milhas.
Com as negociações bem avançadas, Lotus e Ford entraram num
acordo e o que ficou combinado é que Colin Chapman desenharia um novo carro,
baseado no Lotus 25 - que se chamaria Lotus 29 -, e a Ford produziria um motor de
4,2 Litros
V8. Os testes aconteceram em março de 1963, com Clark a fazer as voltas com ele
na pista da Ford no Arizona. O resultado tinha sido satisfatório e agora o
destino era Indianápolis.
A Lotus designou dois carros para este seu debut na Indy
500: Clark estava no comando do nº 92 e Dan Gurney no nº 93. A primeira volta veloz de
Clark bateu na casa de 236,5
Km/h, mas Dan Gurney, muito mais familiarizado com o
Speedway, elevou a marca para 243,8 Km/h chegando perto da que foi alcançada
por Parnelli Jones na pole de 1962, que foi de 244,1 Km/h. Foi um
grande susto para os automobilistas americanos este desempenho e eles ficariam
ainda mais atordoados quando souberam das pretensões da Lotus em fazer apenas
dois pit-stops para cada um de seus pilotos. Colin havia mexido com as
estruturas.
No final das contas a pole ficou mais uma vez com Parnelli
Jones, que atingiu a marca de 244,8 Km/h. Ele foi seguido por AJ Foyt, Jim
Hurtubise e Don Branson. Clark posicionou o seu Lotus num bom quinto lugar com
a velocidade de 242,5
Km/h e Gurney, com a outra Lotus, aparecia na 12ª
posição.
Apesar de um curto período, onde Jim Hurtubise, Roger McCluskey
e AJ Foyt batalharam pela liderança da prova, a grande briga pela ponta na Indy
500 ficou restrita especialmente à Jones e Clark. Apesar do maior número de
voltas na liderança (167), Jones sempre teve Clark em seu encalço. Quando
Parnelli parou para o seu primeiro pit-stop, Jim assumiu a liderança após uma
breve estadia de McCluskey naquele posto. Naquele momento da corrida, a Lotus
tinha seus dois carros nas duas primeiras posições, mas Gurney precisou fazer
sua parada de box que acabou por ser um desastre, o jogando para o meio do pelotão.
Clark entrou poucas voltas depois e saiu em segundo, logo atrás de Parnelli que
passou a aumentar o ritmo. Isso lhe deu uma boa margem para efetuar a sua
segunda parada e voltar na frente de Clark, que agora, com um carro mais leve,
estava alcançando o piloto americano. Pouco tempo depois um vazamento de óleo
do carro de Duane Carter forçou a bandeira amarela. Ainda com uma distância
confortável, Parnelli Jones conseguiu efetuar o seu terceiro pit-stop e voltar
na frente de Clark. Com a corrida voltando ao seu andamento normal, Jim Clark
estava agora há 5 segundos de Parnelli e foi quando o piloto escocês viu que o
carro do piloto americano também vazava óleo. Com as rodadas de Eddie Sachs e
Roger McCluskey por causa do óleo, Jim acabou por diminuir o seu ritmo.
Dos boxes Colin Chapman reclamou veemente com o diretor da
prova, Harlan Fengler, do problema de Jones. De imediato, o diretor mostrou a
bandeira preta o que ocasionava a exclusão de Parnelli da corrida. De imediato
J.C. Agajanian, chefe e dono da equipe por qual corria Parnelli Jones,
protestou fortemente dizendo que o carro não tinha mais vazamento de óleo.
Harlan, pressionado, pegou seu binóculo e avistou que o carro, de fato, não
vazava mais óleo e retirou a punição de Parnelli. Segundo Fengler, o que ele
havia avistado, na verdade, era um vazamento de água e não de óleo, como Colin
tinha dito. Mas as coisas ficariam critícas quando Sachs voltou a rodar e desta
vez bater, no mesmo ponto que havia rodopiado antes forçando a bandeira
amarela. Com Clark preso no meio de tantos outros carros, ficou difícil
acompanhar Jones e quando a bandeira verde foi agitada, faltando sete voltas
para o fim, o piloto escocês pouco pôde fazer e assim Parnelli Jones
conquistava a sua vitória na Indy 500.
Apesar de a discussão ter ido além da corrida, com um entrevero entre Sachs e Jones sobre a polêmica em torno da sua vitória, com
Parnelli desferindo um soco em Eddie após este ter expressado seu ponto de
vista, a verdade é que a Lotus havia deixado todos de cabelos em pé naquela
edição. Com um carro pequenino, que por horas parecia desaparecer no meio dos
grandalhões “Roadsters”, eles conseguiram derrubar o conceito de que apenas carros
de motores dianteiros eram os poderosos naquele tipo de prova. E isso foi
confirmado alguns meses depois, quando a Lotus voltou a alinhar seus dois
modelos 29 para as 200
Milhas de Milwaukee e Jim Clark, além de marcar a pole,
com Gurney em segundo com a outra Lotus, simplesmente dizimou a concorrência ao
fazer uma corrida solitária, abrindo caminho em meio aos retardatários e
conquistar uma vitória com quase uma volta de vantagem sobre o segundo
colocado que foi AJ Foyt. Uma exibição que mostrou bem o que poderia ter
acontecido naquela controversa prova que foi a Indy 500.
Clark cruzando a linha de chegada em segundo, na primeira aparição dele e da Lotus em Indianápolis (Foto: Divulgação) |
Clark continuou a sua caminhada na F1, que resultou no seu
primeiro título mundial depois de ter conquistado sete vitórias, sete poles e
seis voltas rápidas.
Em 1964 Clark e Gurney tiveram a companhia de Jack Brabham
na Indy 500, mas este pilotaria um carro projetado por seu amigo e sócio Ron
Tauranac, que levava o nome de Zink-Urschel TrackBurner com motor Offenhauser posicionado na
traseira. Jim e Dan estavam encarregados de pilotar os novos Lotus 34-Ford. Com
o desempenho assombroso da Lotus na edição anterior, as equipes americanas
trataram de trabalhar carros mais leves. AJ Watson projetou “Roadsters” tanto
na forma tradicional (motor dianteiro) quanto no convencional (traseiro) e
assim deu às equipes e pilotos a oportunidade de escolher com qual correriam.
AJ Foyt optou pela tradição e continuou com seu carro de motor dianteiro,
exemplo que foi seguido pelo atual campeão da prova Parnelli Jones. Rodger
Ward, ex-vencedor da prova, seguiu a nova linha que tendia a dominar as corridas
que era o de motor traseiro e colocou no seu carro um Ford V8, o mesmo que era
utilizado pelos Lotus. No total dos 33 carros que foram para a disputa, 12
tinham motor traseiro.
A pole ficou com Jim Clark, que estabeleceu a marca ao
passar a 257,3 Km/h
na melhor de suas quatro voltas. Nas posições seguintes ficou Bobby Marsham,
Rodger Ward, Parnelli Jones e AJ Foyt. Gurney foi sexto e Brabham o 25º.
O famoso acidente de Macdonald que envolveu outros carros, no inicio da Indy 500 de 1964. (Foto: Forix) |
A corrida teve um ritmo forte de Clark, que sustentou a
liderança e conseguiu abrir 1 segundo de vantagem sobre Parnelli, que foi
superado pelo Lotus 29 de Bobby Marsham na segunda volta. Mais atrás, naquela
mesma volta, o acidente mais grave da história das 500 Milhas teve o seu
início quando o carro do estreante Dave MacDonald rodou e bateu no muro interno
da curva 4 e voltou como uma bola de fogo para a pista. Outros sete carros,
entre eles Bobby Unser e Johnny Rutherford, também se envolveram no acidente,
mas quem levou a pior foi Eddie Sachs que bateu violentamente no carro de
MacDonald formando assim um incêndio ainda maior. A prova foi interrompida e entre o
resgate e o tempo de retirar os pilotos do fogo levaram mais de uma hora e meia.
Infelizmente, Sachs morreu queimado no seu carro, uma vez que estava preso nas
ferragens e MacDonald foi retirado com vida, mas devido às queimaduras e a
inalação da fumaça, veio a falecer horas depois. Segundo relatos da época, o
carro que MacDonald pilotava, era praticamente inguiável uma vez que tinha uma
forte tendência de sair de traseira, o que para um oval da natureza de Indianápolis,
é um convite para o muro.
Clark abandona a prova com o eixo traseiro quebrado (Foto: Divulgação) |
A prova foi retomada depois depois de duas horas
e Jim Clark acabou por ser ultrapassado por Bobby Marsham, que abriu uma boa
distância para o escocês até que ele veio a abandonar com o motor quebrado. Não
demorou muito para Clark, então na liderança, tivesse problemas na suspensão
traseira esquerda da Lotus, que arrebentou em plena reta dos boxes. Jim
conseguiu levar o carro até a grama e abandonar. Receoso de que pudesse
acontecer algo parecido com o outro Lotus, Colin chamou Gurney para os boxes e
pediu-lhe para que abandonasse. Essa atitude de Chapman gerou um mal estar
entre a Lotus e a Ford, que não gostou nenhum pouco de ter visto Colin retirar o
outro carro da prova e essa animosidade durou até a edição seguinte. A luta
pela vitória ficou entre Jones, Foyt e Ward, e apesar da forte concorrência
vinda do carro de motor traseiro de Roger Ward, foi AJ Foyt quem saiu vencedor
da corrida, nesta que foi a última vitória de um carro com motor dianteiro em Indianápolis - detalhe
em especial para o próprio Foyt, que realizou todo o percurso sem trocar de
pneus.
Devido os acontecimentos de 1964, a USAC (United States
Auto Club) colocou algumas regras a serem seguidas naquela edição de 1965 da
Indy 500: passou a ser obrigatório ao menos duas paradas de box; o tanque de
combustível foi diminuído; a gasolina não foi banida de imediato, mas a USAC
passou a incentivar os times a usarem o metanol – que com o tempo substituiu a
gasolina. Com essas medidas, os carros partiriam com menos combustível e assim
evitaria uma catástrofe como a de 1964.
Foyt, Clark e Gurney: a primeira fila para a Indy 500 de 1965 (Foto: IMS Archives) |
A idéia de carros com motores centrais já havia espalhado e
agora apenas seis carros ainda usavam motores dianteiros e nessa batalha dos
propulsores, a briga estava dividida: a Ford tinha 17 carros no grid e a
Offenhauser 16. A
Lotus levou para Indianápolis três novos modelos, agora chamados de Lotus 38:
Clark ficou no comando do nº 82, Dan Gurney pilotou o nº3 que correu sob as
cores da All-American Racing Team e um terceiro, de nº83, foi para o piloto da
NASCAR Bobby Johns. A oposição vinha dos mesmos pilotos de sempre, mas estes
tinham uma arma que Clark e Chapman conheciam bem: AJ Foyt e Parnelli Jones
arrendaram os Lotus 34 que foram usados na edição de 1964.
A batalha pela pole foi entre Clark e Foyt. O escocês
conseguiu atingir 260,3
Km/h na sua primeira tentativa, sendo o primeiro piloto
da história a conseguir uma marca acima dos 260 Km/h. Mas a festa
durou pouco e AJ Foyt elevou o tempo para 262,3 Km/h cravando
assim a pole para a prova. Seguindo Foyt e Clark, Dan Gurney marcou o terceiro
tempo, com o novato Mario Andretti em quarto, Parnelli Jones em quinto e o
canadense Billy Foster em sexto enquanto que a outra Lotus 38 conduzida por Bobby Johns ficou na 22ª
colocação. Além da estréia de Andretti nesta corrida, outros dois pilotos que
fariam história no futuro das 500 Milhas também estrearam: Al Unser, que
largou em 32º; Gordon Johncock, que saiu em 14º e Joe Leonard, que partiu da
27ª posição.
Disputa de gigantes: Jim Clark, A.J Foyt e Parnelli Jones durante a Indy 500 de 1965 (Foto: Divulgação) |
A corrida foi a mais tranqüila possível e nenhum acidente com
gravidade aconteceu. O duelo entre as Lotus de AJ Foyt e Jim Clark foi o ponto
alto da corrida. Jim assumiu a liderança logo após a largada, mas tomou uma
ultrapassagem de Foyt logo na segunda volta. Numa caçada de gato e rato, Clark
voltou ao comando na terceira volta. Um início sensacional. Mais atrás, na
terceira posição, Jones observava tudo atentamente e com a disputa entre os
dois contendores foi diminuindo a diferença até conseguir ultrapassar Foyt. Jim
largou a liderança na volta 65 quando teve que fazer o seu pit-stop, e assim
Foyt assumiu a ponta até a passagem 74 quando também parou. Jim reassumiu a
liderança para não mais largar. Foyt abandonou na volta 115 com problemas de
câmbio e Parnelli Jones subiu para o segundo lugar, mas sem muitas chances de
alcançar o piloto escocês.
Na terceira tentativa, a Lotus e Jim Clark conseguem a
vitória na Indy 500. Jim foi magistral na condução do Lotus 38 e o nº 82 virou
lenda no Brickyard. Ele liderou nada mais que 190 voltas e chegou
confortavelmente na frente de Parnelli Jones, com duas voltas de avanço e
tornou-se o primeiro piloto europeu a vencer as 500 Milhas de
Indianápolis desde Dario Resta, que ganhara em 1916 com um Peugeot. Outros
tabus foram quebrados: a Lotus, que se tornou a primeira equipe européia a
vencer a corrida desde a Peugeot em 1919 e a primeira vitória de um carro com
motor traseiro na história aposentando, de vez, os dinossauros de motores
dianteiros.
O ano da Lotus ainda foi agraciado pelo título de pilotos e
construtores, com Clark vencendo pela segunda vez o Mundial de Pilotos. Mas o
objetivo principal tinha sido alcançado: eles haviam conquistado a América e
mudado os conceitos das corridas de monopostos na terra dos ianques.
E o Clark pronto para mais uma conquista após a vitória em Indianápolis (Foto: Divulgação) |
A associação com Andy Granatelli, carros
Turbina e o fim da aventura na América
Os carros Turbina e Lotus: apesar da idéia paracer frutífera, acabou por ser um grande fracasso (Foto: Divulgação) |
A 50ª edição das 500 Milhas de Indianápolis, disputada em 1966,
foi uma luta particularmente européia: apesar da pole alcançada por Mario
Andretti, com o recorde de 266,9
Km/h, a prova foi dominada por Jim Clark (Lotus), Jackie
Stewart e Graham Hill (Lola). Jackie teve um bom desempenho na corrida, mas
abandonou com problemas na pressão de óleo quando estava prestes a vencer a
Indy 500 em sua primeira participação. Graham Hill herdou a liderança e venceu
para a Lola, com Jim Clark terminando em segundo com a Lotus. Mas a prova teve
uma polêmica: a Lotus apresentou um protesto ao final da corrida, admitindo que
Clark era o real vencedor. Jim havia rodado duas vezes durante a sua estadia
na liderança e foi aos boxes para verificar se nada de anormal tinha
acontecido, voltando normalmente para a corrida. O problema é que a torre que
mostra o posicionamento dos carros na corrida, pouco mudou e a equipe Lotus
ainda acreditava que Clark estava na frente de Hill com duas voltas de avanço.
No dia seguinte, com a apresentação do resultado oficialmente corrigido,
Chapman não apresentou o protesto e o que foi divulgado é que os membros da
Lotus não viram Graham ultrapassar Clark na sua segunda rodada. A verdade é que
a controvérsia dura até hoje sobre quem realmente venceu aquela edição.
Outra hipótese que foi abordada é que Al Unser, que abandonara a corrida a 161ª
volta, havia sido a causa do engano, uma vez que seu carro tinha as cores e o
layout bem parecido com o de Clark. Sendo assim, os controladores da torre de
posições acabaram se enganando e tirando uma volta de Clark ao pensar que tinha
sido o escocês a ter problemas. Mais uma história para o rico folclore da Indy
500.
Jim Clark ficou em segundo na edição de 1966, perdendo a prova para o seu amigo Graham Hill, que pilotava um Lola-Ford (Foto: Divulgação) |
Exatamente nesta edição de 1966 é que começou a associação
de Colin Chapman com Andy Granatelli, ainda no âmbito de patrocínio. Anthony
“Andy” Granatelli era um assíduo freqüentador das 500 Milhas de
Indianápolis e a sua primeira aparição nesta corrida remonta a 1946, quando ele
inscreveu a equipe Grancor junto de seus irmãos Vince e Joe. Dois anos depois
ele tentou qualificar-se para a Indy 500, mas um acidente nas qualificações
quase pôs fim a sua vida e desde então ele encerrou a sua curta carreira de
piloto. Ele se enveredou pelo mundo das corridas, promovendo e organizando
eventos, desde provas de Hot-Roads até corridas da NASCAR quando foi
vice-presidente da entidade. Em 1954 foi contratado pela STP, uma empresa de produtos
automotivos, e ele passou a ser o garoto propaganda da marca na TV e rádio. Nos
nove primeiros anos, a empresa chegou a 2.000 funcionários e a marca também
expandiu para as corridas pintando os carros patrocinados nas cores da STP, o
vermelho e branco.
Em 1967, na 51ª edição das 500 Milhas de
Indianápolis, Andy Granatelli inscreveu um carro batizado de Granatelli Turbine
que utilizava um motor movido a turbina de helicóptero e este foi entregue ao
experiente Parnelli Jones. Entrando para a sua quinta participação, esta era a
primeira vez que a Lotus não encabeçava a lista dos favoritos: Jim Clark (que
largou da 16ª posição) e Graham Hill (que saiu da 32ª) não completaram a prova
por problemas de motor antes de completarem o primeiro quarto de prova.
A prova teve duas partes: no dia 30 de maio ela teve seu
início, mas foi interrompida na 18ª volta devido à chuva e foi retomada no dia
seguinte. Mario Andretti, que mais uma vez saiu da pole, pouco pôde desfrutar
da liderança já que Parnelli Jones, com Granatelli Turbine, partiu feito um raio
e assumiu a liderança ainda na primeira volta. A corrida foi dominada
amplamente por Jones, que liderou nada mais que 197 voltas. Quando estava
pronto para vencer a corrida, com quase uma volta de vantagem sobre AJ Foyt,
Parnelli entrou nos boxes com um rolamento da transmissão quebrado, que custava
nada mais que seis míseros dólares. Uma derrota por uma mixaria... AJ Foyt, que
vinha em segundo ainda escapou de um acidente que envolveu quatro carros e
passou para vencer a sua terceira Indy 500.
O STP Turbine com Parnelli Jones ao volante, em 1967 (Foto: Divulgação) |
No ano de 1968
a USAC, por pressão das demais equipes, restringiu o uso
da Turbina. O desempenho apresentado por Parnelli Jones e 1967 tinha sido
assustador e a USAC decretou a diminuição da tomada de ar destes carros de
154,8 cm2 para 103,2 cm2, forçando a Lotus a diminuir o tamanho do compressor e
assim a potência caindo para 430cv.
Colin Chapman, agora associado à Granatelli, projetou um
carro totalmente diferente dos demais que corriam em Indianápolis: com um
perfil baixo e em forma de cunha, o carro se assemelhava a uma asa, a fim de
aproveitar totalmente a pressão aerodinâmica nas curvas e combinado com a
Turbina, este se revelava um foguete. Jim Clark testou-o em Indianápolis e
tinha ficado animado com o resultado, mas nem chegou a classificar: Clark
morrera em sete de abril durante uma prova de F2 em Hockenheim e Colin perdia
seu amigo e piloto de referência. Para o lugar de Jim, Mike Spence foi
escalado, mas este teve o azar de sofrer um acidente em Indianápolis e um dos
pneus bater na sua cabeça, vindo lhe causar a morte no mesmo dia que completava
um mês da morte de Clark. Um baque para Colin Chapman, que entregou a equipe
para Granatelli durante os treinos. Os dois Lotus 56 ficaram a cargo de Art
Pollard e Joe Leonard, que se juntaram à Graham Hill. Joe Leonard mostrou o
potencial do Lotus 56 ao fazer a pole com a marca de 278 Km/h e Graham Hill
colocou o outro Lotus na segunda colocação, ao fazer 277 Km/h. Bobby Unser, com
o Eagle-Offenhauser, fechou a primeira fila.
Joe Leonard assumiu a liderança da prova, mas, por recomendações
da equipe, ele deixou Bobby Unser e Lloyd Ruby assumirem as duas primeiras
posições. A estratégia era usar toda a potência da Turbina na parte final da
corrida e deste modo, Joe ficou apenas comboiando os dois primeiros durante
quase toda a corrida. Graham Hill, que vinha na quarta colocação, bateu na
volta 112 deixando Chapman um tanto preocupado e este só se acalmou quando
anunciaram que o piloto inglês estava bem.
O grid de largada para a Indy 500 de 1968: os dois Lotus Turbina de Joe Leonard e Graham Hill nas duas primeiras posições e Bobby Unser com o Eagle-Ford em terceiro (Foto: Jalopnik) |
Faltando 25 voltas para o fim, Joe pôs a estratégia em
prática e passou a andar extremamente rápido e assumiu a liderança que pertencia
a Lloyd Ruby que enfrentava problemas de ignição e despencava vertiginosamente
de posições. Há 18 voltas do fim um acidente forçou as bandeiras amarelas e
isso acabou por ser um tiro no pé de Joe Leonard. O seu carro, andando em baixa
velocidade, começou a ter problema na Turbina que aumentou consideravelmente a
temperatura devido o pouco ar que era admitido para o motor. Quando relargaram
e Leonard cravou o pé no acelerador, o motor cuspiu uma labareda azul e apagou
o motor em seguida. Mais
uma vez o sonho de Andy Granatelli tinha ido para o ralo e Bobby Unser passou
para vencer a sua primeira Indy 500 – essa foi a última Indy 500 em que um
carro com motor dianteiro participou: Jim Hurtubise classificou em 30º e
abandonou na volta nove com problemas de motor e nesta corrida é que foram feitas filmagens para o longa “Winning”, estrelado por Paul Newman. Os motores Turbina não
estariam presentes mais em Indianápolis, uma vez que a restrição para a tomada
de ar seria diminuída para 77,36 cm2 para o ano seguinte, o que tornava este
motor totalmente inútil.
Para a Lotus a aventura nas 500 Milhas teve fim em
1969, quando a equipe entregou a Granatelli os novos Lotus 64 que seriam usados
por Mario Andretti, Graham Hill e Jochen Rindt. Mas na primeira
volta de
Andretti com este carro, quando ele alcançou 278 Km/h na classificação,
um cubo de roda quebrou e lançou o piloto americano contra o muro. O acidente
causou um pequeno incêndio, que logo foi controlado, mas Andretti sofreu
algumas queimaduras. A Lotus detectou o problema e seus carros foram retirados
da prova, assim como as inscrições de Hill e Rindt.
Mario Andretti e o Lotus 64 |
Mario Andretti, ainda com o apoio da STP, correu com um Hawk-Ford
e classificou-se em segundo, com a pole ficando para AJ Foyt no seu Coyote-Ford.
A disputa foi polarizada entre Lloyd Ruby, Mario Andretti e AJ Foyt, e Andretti
acabou por vencer a corrida proporcionando a ele, e Andy Granatelli, o primeiro
triunfo na Indy 500.
O desafio lançando quando alinharam os dois Lotus 29 para
Clark e Gurney em 1963, tinha chegado ao fim para a equipe de Colin Chapman na
Indy 500. O espanto da comunidade automobilística americana em ver aquele
pequeno carro verde de motor traseiro desafiando os grandes Roadsters de motores dianteiros na sua casa,
soou como uma luta entre Davi e Golias que acabou por ser vencido pelo
pequenino carro inglês na sua terceira tentativa. Do mesmo modo que ele
revolucionara a construção dos F1 na Europa, ele também influenciou na
competição de monopostos da América, tanto que três anos após a vitória de
Clark, os carros de motores dianteiros tinham sido riscados do mapa e o
conhecimento adquirido na construção do quase vencedor Lotus 56, foi levado
para a Europa e lá Colin aplicou na construção de um dos mais bem sucedidos
carros de corridas de todos os tempos: o Lotus 72, além, claro, da parceria
vitoriosa com a Ford que durou até o início dos anos 80.
A aventura na América tinha sido frutífera para ambos os
lados.
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