A coisa que mais prezo em uma pilotagem é a coragem e
virtuosismo do piloto em mudar as condições de condução conforme o momento que
a corrida exige. São nessas situações que você se depara com atuações dignas de
Oscar, daquelas que ficam gravadas na retina por anos e anos e que
frequentemente são relembradas em rodas de conversas e em textos e vídeos
espalhados pela internet. Vitórias conquistadas à luz da estratégia são
inteligentes, bonitas até, mas não se compara a conquistas tiradas a fórceps. O
caso do GP da Bélgica de 1995 é um desses, onde Michael Schumacher, até então
campeão reinante da Fórmula-1, mostrou ao mundo como lidar com uma série de
variáveis sem pestanejar e conquistar uma vitória épica em seu território
favorito que é Spa-Francorchamps.
O magnífico circuito das Ardenas recebeu a 11ª etapa de 1995
com o tempo totalmente instável para aquele último fim de semana de agosto, e
como era de se esperar, devido esta situação, a classificação marcou uma boa
surpresa: as Ferraris marcaram a primeira fila com Berger em primeiro e Alesi
em segundo, aproveitando-se bem da rápida manobra de Jean Todt em mandá-los
para a pista assim que esta secou após a chuva que caíra no início da
classificação. A esperteza do pequenino francês foi vital, pois a chuva voltou
logo depois e mais ninguém pôde ameaçar o duo vermelho. Logo atrás apareceram
Mika Hakkinen e Johnny Herbert, seguidos por David Coulthard, Mark Blundell,
Eddie Irvine e Damon Hill, que marcara apenas o oitavo tempo. Sua volta tinha
sido arruinada por Andrea Montermini (Pacific) quando tinha hipóteses de ir
mais à frente na classificação e logo depois apareceu a chuva e nada mais pôde
fazer. Michael Schumacher tinha sofrido um forte acidente na Malmedy durante o
terceiro treino livre, o que deixou seu Benetton destruído e irrecuperável para
a classificação. Teve que esperar o término dos trabalhos de Herbert para que
pudesse tomar posse do carro do inglês. Com isso, ele teve tempo de fazer a
volta que lhe deu a 16ª colocação no grid.
Sem os dois principais pilotos na dianteira da corrida, esta
se viu numa disputa aberta entre os coadjuvantes naquelas primeiras voltas: se
os Ferraris foram perfeitos na classificação, a largada foi péssima,
principalmente por conta de Berger que perdera as duas primeiras posições para
Herbert e Alesi, com o francês recuperando em seguida. O brilharete da Ferrari
foi até a terceira volta, quando Jean teve uma quebra de suspensão e ficou de
fora. Herbert era o novo líder, mas com Berger em seu encalço que era seguido
de perto pelas Williams de Coulthard e Hill. Schumacher continuava a sua
escalada e já estava em nono na quarta volta. Mas não demorou muito para os
carros de Frank Williams superassem a Ferrari de Gerhard.
David Coulthard partiu para o ataque contra Herbert, que
suportou a pressão até que o inglês errou e entregou de bandeja a liderança
para o jovem escocês. Coulthard parecia decidido que conseguiria a sua primeira
vitória em Spa, tanto que abria boa vantagem para Damon até que o câmbio do
carro de David apresentou problemas na 13ª volta e o tirou de combate. Hill
subiu para a liderança, mas a sombra de Michael Schumacher já estava próxima de
certa forma: com uma pilotagem agressiva e aproveitando-se bem das oportunidades,
o alemão já estava em terceiro naquele momento e apenas o Ferrari de Berger é
que o separava de Damon.
Os dois contendores pelo título mundial pararam juntos para
o primeiro reabastecimento e troca de pneus de ambos, com o inglês mantendo a
ponta da corrida por um curto espaço de tempo, afinal a chuva começara a cair.
Damon e a Williams não demoraram muito a optar pela troca de pneus de chuva e
enquanto o trabalho era feito, Schumacher tratou de se manter na pista,
equilibrando-se como podia com pneus slick em trechos totalmente encharcados.
Correndo nessa condição a chegada de Hill foi rápida, mas não foi fácil dobrar
o piloto alemão que se defendia de todos os modos – alguns deles de modo
controversos, que depois geraria uma série de reclamações de Damon – e que só
“entregou” a posição quando errou na Le Combes. No entanto, com chuva dando uma
parada e a pista começando a secar, Hill não conseguiu uma distância
confortável o suficiente para tentar outra parada e voltar à frente de
Schumacher.
Com a pista já bem mais seca, Hill teve que ir aos boxes
trocar pelos slicks, mas na pressa de voltar à pista acabou excedendo a
velocidade no pit-lane e teve que pagar um “Stop & Go”, exatamente no
momento que o Safety Car foi acionado devido a chuva que voltara a cair. Este
ficou por três voltas e em seguida Hill teve ir aos boxes pagar a sua
penalização, que o relegou para terceiro e que mais tarde, precisamente na
última volta, conseguiu superar Martin Brundle na luta pela segunda posição.
Para Michael Schumacher, que havia largado em 16º e escalado
o pelotão com uma pilotagem, foi a décima sexta vitória de uma carreira que se
encaminhava a passos para o bi-campeonato. E sem dúvida, naquela altura de sua
vida, tinha sido a melhor atuação na F1. Apesar de toda controvérsia.
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