Acho que para alavancar algo em certos lugares – leia-se
países – é preciso ter uma referência, só deste modo é que as coisas podem
fluir normalmente e virar uma febre.
Foi assim com a Fórmula-1 por aqui quando
Emerson Fittipaldi apareceu repentinamente na categoria e passou a vencer com
freqüência, até que chegasse aos seus títulos mundiais. Por mais que a
experiência com o Fittipaldi Copersucar não tenha alcançado os sonhos que eles
(irmão Fittipaldi) alçaram, a semente já havia sido semeada e germinaria
rapidamente com a aparição de inúmeros pilotos brasileiros na categoria até que
culminasse nas conquistas de Nelson Piquet e Ayrton Senna. E isso teve certa
prorrogação com Rubens Barrichello e Felipe Massa. Emerson também contribuiu
muito para a popularização do automobilismo norte americano com a sua ida para
a Indycar nos anos 80, causando o mesmo efeito e abrindo o caminho para outras
gerações que viram suas vitórias e título na categoria, isso sem contar suas
duas conquistas na mágica 500 Milhas de Indianápolis. André Ribeiro, Christian
Fittipaldi, Gil De Ferran, Helio Castroneves, Tony Kanaan e tantos outros que
passaram e venceram – e continuam vencendo – por lá, tem muito que agradecer
por esta “descoberta” de Emerson.
As provas de endurance por aqui ainda engatinham: as pessoas
vêem as corridas com certa curiosidade, mas ainda não as encaram como provas da
nata automobilística. Ainda tem em suas mentes que a Fórmula-1 ainda é o grande
reduto do esporte a motor, onde que, para alcançar o olimpo dessa modalidade,
você precisa vencer lá para mostrar que é o melhor do resto. A categoria ainda
tem essa áurea, isso não podemos discutir, mas faz um par de anos que a
Fórmula-1 tem perdido seu espaço no coração dos espectadores e também na
preferência do pilotos. Para os fãs, o domínio único de uma equipe, os
regulamentos cada vez mais confusos e a falta de competitividade têm os
deixando mais insatisfeitos e por isso migraram suas atenções para outras
categorias como a NASCAR, WEC e provas de turismo. Para os pilotos que
almejavam chegar na categoria máxima, seus sonhos foram ficando pelo caminho a
partir do momento que as vagas na equipe passaram a ser leiloadas ao invés de
investirem pesado no talento natural, que muitos certamente tinham. Por isso que
hoje, ao invés de tentarem chegar na F1 com caminhões de dinheiro, eles se
viram para outras praças onde os lugares podem até ser comprados, mas por
quantias bem mais modestas do que na F1. Ou acabam tendo seu talento
reconhecido e ingressam em equipes onde possam ter reais chances de conquistar
vitórias e até títulos, coisa que na F1 só conseguiriam se tivessem um bom
dinheiro, ou numa equipe de ponta – que contasse com suas escolinhas – ou até
mesmo um padrinho muito influente na categoria.
Pipo Derani mostrou neste fim de semana em Daytona que a as escolha em se
aventurar no mundo dos protótipos tem sido a melhor: não podemos negar o
talento deste piloto brasileiro ao volante destes carros da LMP2, que já fora
visto anos atrás nas 4 Horas de Estoril, válido pela ELMS, e depois nos seus
serviços prestados na LMP2 do WEC em 2015. Fazendo parte da equipe Tequila
Patrón ESM, ele assumiu o Ligier JS P2 em seus turnos e deu todo seu potencial
para abrir caminho a uma vitória inédita da equipe nas 24 Horas de Daytona,
assim como de um modelo LMP2 e também da Honda em solo americano. E claro, para
ele também, do alto de seus 22 anos, já carrega uma vitória numa das mais
clássicas provas de endurance no mundo. E certamente, nesta crescente dele,
outras oportunidades aparecerão e ele poderá aumentar este cartel.
Para o automobilismo brasileiro os demais representantes
também contribuíram para esta que foi a melhor edição para o pilotos daqui:
Rubens Barrichello, que ingressou na equipe da Wayne Taylor na semana da prova,
fechou na segunda posição junto de seus companheiros. E a equipe teve boas
hipóteses de vitória, mas não contavam com um passo espetacular de Pipo Derani
com o Ligier da ESM. Igualmente a Action Express também estava com chances de
dar a Christian Fittipaldi a oportunidade de chegar a sua terceira conquista em
Daytona, mas problemas mecânicos acabaram deixando-os de fora do pódio ao
terminar em quarto. Tony Kanaan, pela Chip Ganassi, era outro com boas chances,
mas o Riley DP também teve seus contratempos por causa de problemas nos freios
e mais tarde por conta de um acidente quando Kyle Larson estava ao volante,
fazendo com que eles terminassem em sétimo na classe dos Protótipos e em 13º no
geral. E ainda tivemos representantes na competitiva GTLM: Daniel Serra, a
serviço da Scuderia Corsa, que estreava a Ferrari 488 GTE, fechou em quarto na
classe e Augusto Farfus, sempre com a BMW, foi o quinto com a M6.
Enquanto que esta edição entra para a história do
automobilismo nacional com mais este triunfo brasileiro em Daytona, acredito
que mais uma vez a semente foi semeada. A escolha mais do que certa de Pipo
Derani em seguir uma carreira num mundo desconhecido para a maioria do público brasileiro, dá uma chance para que novas gerações também olhem para as provas
de endurance com mais atenção. Os esforços de pilotos como Oswaldo Negri Jr. e
Christian Fittipaldi, os melhores pilotos brasileiros no mundo das provas de
resistência, ganhou um reforço e tanto com esta vitória de Derani e se as
coisas começarem a engrenar, podemos formar uma nova legião de pilotos
nacionais invadindo estas corridas, assim como foi nos tempos de Emerson na F1
e Indycar.
E pra você que ainda resiste em assistir as provas de
endurance, reveja seus conceitos: veja alguns vídeos desta edição, de edições
passadas desta prova e de outras corridas. Isso certamente abrirá seu “apetite”
por estas corridas sensacionais, com carros da mais alta tecnologia desde os
protótipos até os GTs.
E para você que não gosta de endurance, meus pêsames! Não
sabe o que está perdendo.
Mas ainda é tempo de reverter. Afinal, as sementes já foram plantadas.