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Tazio Nuvolari num dos trechos do circuito de Nurburgring em 1935 |
Certa vez alguém falou que o piloto que conseguisse andar
bem em Spa-Francorchamps, teria sucesso nos demais circuitos do calendário da
Fórmula-1. De certa forma, tem seu fundo de verdade, mas em outros tempos
Nurburgring era o parâmetro para isso e quando quase todas as categorias
frequentavam o “Inferno Verde” ficava fácil distinguir quem tinha o real
talento para a coisa, e isso servia tanto para o automobilismo quanto para o
motociclismo. Independente se o Nordschleife fosse combinado com o Sudscheleife
ou apenas no seu formato original, o impressionate circuito de quase 23 km era
o grande desafio e domar aquele sinuoso traçado, ladeado por árvores e
barrancos, era o desafio supremo comparado apenas a enfrentar as estradas
empoeiradas e/ou lamacentas que faziam parte do percurso da Targa Florio. Rudolf
Caracciola e Bernd Rosemeyer eram os homens que conseguiam decifrar aquele
circuito e domá-lo nas mais variadas situações climáticas, mas houve outro
piloto que andava tão bem quanto eles naquele local, mas que até então não
havia conquistado uma vitória naquele solo: Tazio Nuvolari fez a corrida de uma
vida na edição de 1935 e para chegar nesta que foi a sua única conquista no
fabuloso Nordschleife, precisou desafiar a poderosa armada alemã que foi
representada por Mercedes e Auto Union.
Recuando no tempo, precisamente no ano de 1935, o
Campeonato Europeu de Pilotos estava de volta após dois anos de recesso e agora
sob a luz dos regulamentos que permitiam carros de até 750kg. Desta vez, ao
contrário do que foi visto em 1932 com Tazio Nuvolari dominando aquele
campeonato, as vedetes da vez eram os carros alemães que estavam representados
pela Mercedes-Benz e Auto Union que haviam entrado na competição já em 1934.
Sabia-se desde já que o favoritismo repousaria sobre eles e apenas
circunstâncias extremas é que poderiam contribuir para derrota destas equipes.
Do outro lado da moeda, apareciam os italianos que até o final de 1933 eram os
soberanos nas competições europeias: os até então poderosos Alfa Romeo P3 que
eram de propriedade da Scuderia Ferrari, agora estavam imensamente superados
pelos carros alemães, seja em potência, seja em mecânica – a defasagem de motor
entre eles chegava ultrapassar os 100cv de potência e isso fazia uma tremenda
diferença na maior parte dos circuitos europeus daquele tempo, que exigiam ao
máximo da velocidade – e isso, tanto
Mercedes quanto Auto Union, tinham de sobra. Portanto, se os Alfa Romeo P3 já
não eram páreo para os W25B da Mercedes e os Type B da Auto Union, outras
fabricantes como Maserati, Bugatti e ERA teriam suas chances reduzidas a zero.
Para Tazio Nuvolari, o grande piloto daquele tempo,
o ano de 1935 foi de retomada. Sabe-se que a sua saída da Scuderia Ferrari em
julho de 1933 devido a desavenças com Enzo Ferrari, significava que as portas
estavam fechadas. Porém foi tentar a sorte na Maserati a partir da segunda
metade de 1933 onde acabou por vencer três corridas das sete que conseguira
naquela temporada, mas em 1934, já com a presença das fábricas alemãs, o máximo
que conseguiu foram duas conquistas em Modena e Nápoles provas que não contaram
com a presença dos alemães. A melhor qualidade dos carros da Mercedes e Auto
Union abriu curiosidade de Nuvolari em tentar vagas numa dessas equipes, já que
eram as únicas que poderiam lhe dar uma real chance de vitória. Apesar das
tentativas, as duas recusaram a presença de mantuano com direito até de uma
carta vinda da Auto Union onde os pilotos não teriam gostado da idéia de ter
Tazio por lá – mas na verdade sabe-se que a relação entre Nuvolari e Achille
Varzi, então piloto da equipe alemã em 1934, nunca foi das melhores e talvez,
aí, é que tenha aparecido o tal empecilho. Com as portas de Mercedes e Auto
Union fechadas, restou ao piloto nascido em Mântua a mirar seus esforços de
voltar a equipe de Enzo Ferrari. Apesar de Ferrari ter negado a principio o
retorno de Tazio para sua equipe, ele acabou cedendo quando a politica
interveio: Benito Mussolini exigiu que Nuvolari fosse o principal piloto da
Scuderia naquele ano, uma vez que a equipe já colocara René Dreyfus e Louis
Chiron como principais líderes. A contragosto de Enzo, o “Mantuano Voador” estava
de volta.
Antes que o Campeonato Europeu tivesse seu inicio,
a Scuderia Ferrari venceu a primeira prova do ano realizado no circuito de rua
em Pau, onde Tazio Nuvolari e Rene Dreyfus, com os dois únicos Alfa Tipo B/P3
inscritos pela equipe, dominaram o Grand Prix de Pau. Tazio acabou por vencer a
prova com Dreyfus em segundo e Luigi Soffietti (Maserati) em terceiro. Apesar
do inicio animador, sabia-se que resultado desta ordem seria bem difícil de se
repetir quando Mercedes e Auto Union estivessem presentes – e isso ficou bem
claro em provas como Trípoli e Avus, onde a Scuderia Ferrari desafiou os
alemães e perdeu justamente quando colocou seu Alfa Romeo P3 Bimotore que
debitava 540cv, mas que sofria com o alto peso que ficava em cerca de 1000kg
por conta dos dois motores Isso prejudicava e muito o consumo dos pneus – e
também dos freios, que eram menores –, como ficou visto em Tripoli onde
Nuvolari parou duas vezes nas sete primeiras voltas para trocar um dos pneus
traseiros que havia se desgastado. Mesmo com estes problemas e contando com uma
prova bem variável, a Scuderia Ferrari ainda colocou três carros entre os dez
melhores, com os dois Bimotores de Nuvolari e Louis Chiron em quarto e quinto e
em sexto Dreyfus com um P3 tradicional em prova que foi vencida por Rudolf
Caracciola (Mercedes). Em Avus, Louis Chiron garantiu um segundo lugar na prova
final, mas problemas extra-pista acabaram prejudicando o andamento da Scuderia
Ferrari já que peças importantes do carro – como as engrenagens do câmbio, por
exemplo – foram perdidas quando a equipe voltava de Trípoli. Luigi Fagioli, com
Mercedes, garantiu a vitória em Avus.
O Campeonato Europeu, era constituído por sete GPs,
teve seu início em Mônaco onde a Mercedes acabou por vencer com Luigi Fagioli e
a Scuderia Ferrari tendo em Rene Dreyfus seu melhor piloto, ao terminar em
segundo com 31 segundos de atraso para Fagioli. A equipe de Enzo Ferrari ainda
teve Antonio Brivio em terceiro e Louis Chiron em quinto. Tazio Nuvolari, que
dividiu o carro com Carlo Felice Trossi, deixando para este a condução do Alfa
P3 após detectar problemas de freios na 39ª volta, acabou abandonando na volta
53 devido a este problema. Em Linàs Montlhery, para o tradicional GP do
Automovel Clube da França, os dois Alfa P3 conduzidos por Nuvolari e Chiron
conseguiram dar combate aos Mercedes e Auto Union até a volta 14, quando Tazio,
que havia liderado parte da prova e com ritmo muito bom , abandonou com
problemas no diferencial – o mesmo que afetara Chiron na volta 8. Rudolf
Caracciola venceu pela Mercedes e Manfred Von Brauchitsch, também com Mercedes,
ficou em segundo. No GP da Bélgica, em Spa-Francorchamps, a vitória foi mais um
vez da Mercedes com Caracciola em primeiro e Fagioli/ Brauchitsch em segundo
com a outra Mercedes. Os dois Alfa P3 presentes da Scuderia Ferrari foram
conduzidos por Louis Chiron e Rene Dreyfus – este último em conjunto com
Attilio Marinoni – ficaram em terceiro e quarto, com Chiron ocupando o pódio. O
próximo GP era o mais esperado pelos alemães, onde o imponente – e temível –
Nurburgring seria o palco do GP da Alemanha.
Para Nurburgring, 22 carros foram inscritos: a
Mercedes levou cinco carros para esta provas, sendo que dois eram o W25B que
ficaram para Rudolf Caracciola e Manfred Von Brauchitsch, enquanto que Luigi
Fagioli, Hanns Geier e Hermann Lang ficaram com o W24A de 1934 totalmente
reformulados. A Auto Union levou quatro Type B para Bernd Rosemeyer, Hans
Stuck, Achille Varzi e Paul Pietsch. Este foi o retorno da equipe alemã após
duas provas de ausência, onde procuraram melhorar o motor V16 do Type B que
apresentara muitos problemas ali mesmo em Nurburgring quando foi realizada a
Eifelrennen e no GP francês em Montlhéry, os dois no mês de junho. Para isso, a
equipe trabalhou incansavelmente e tiveram uma semana completa de testes em
Nurburgring para solucionar estes contratempos.
A Alfa Romeo colocou três Alfa P3B para Tazio
Nuvolari, Louis Chiron e Rene Dreyfus, mas este último teve problemas de saúde
e acabou sendo substituído por Antonio Brivio. Durante as práticas para o GP, a
Alfa Romeo resolveu problemas de freio em seus carros e teve uma boa impressão
ao verificar que seus carros conseguiam ir mais rápidos que os carros alemães
na parte sinuosa do Nordschleife, apesar de, na volta total, ainda perdesse um
bocado para os anfitriões.
A Scuderia Subalpina levaria três dos novos
Maserati V8-RI de 4,8 litros, mas acabou desistindo e inscreveu três dos já
conhecidos 6C-34 de seis cilindros para Goffredo Zehender, Philippe Etancelin e
Eugenio Siena e um 8CM para Pietro Ghersi – este último acabou substituindo
Eugenio, o que reduziu contingente da Scuderia para três carros. O Maserati V8
haviam estreado na em Reims, onde foi realizado o GP de Marne no inicio de julho.
A ERA de Raymond Mays também se fez presente para
essa etapa com dois modelos ERA B, sendo um para ele outro para Ernest Von Delius. A Bugatti
inscreveu um T59 para Piero Taruffi e as demais inscrições consistiam em
pilotos particulares: Renato Balestrero com Maserati 8C3000; László Hartmann e
Hans Rüesch com Maserati 8CM que cada um inscreveu por conta própria.
Apesar da lista apresentar 22 inscrições, apenas vinte
carros largaram já que a Scuderia Subalpina competiu com três Maserati e o ERA
de Von Delius que ficou de fora após o acidente e o piloto alemão acabou
dividindo o outro ERA com Raymond Mays.
Este GP da Alemanha foi o quarto do calendário
tornou-se um dos mais importantes do ano, partindo com a sua polpuda premiação
que girava na cas dos 43.000 Reichmarks que foram distribuídos do vencedor até
o sexto colocado (divisão dos prêmio: 20
mil para o primeiro; 10 mil para o segundo;
6 mil para o terceiro; 4 mil para o quarto; 2 mil para o quinto; e 1 mil
para o sexto). A prova teve o envolvimento de três entidades: a ONS (Oberste
Nationale Sportbehörde) esteve na organização da corrida, mas toda a execução
desportiva ficou a cargo da DDAC (Der Deutsche Automobil-Club) e da NSKK
(National-Sozialistiche Kraftfahr-Korps).
Uma qualificação confusa e uma
corrida histórica
Houve um belo problema envolto da qualificação para
esta prova: com o intuito de eliminar qualquer chance dos carros mais lentos atrapalhassem
os mais velozes durante a largada e a idéia que foi colocada era de determinar
as posições através de uma pequena prova de arrancada, onde os pilotos
partiriam da linha de largada e teriam seu tempo fechado assim que passassem no
ponto determinado na reta de trás dos boxes, o que dava em torno de 1,4km de
distância utilizando parte do ciruito “Betonschleife”. A idéia parecia
boa, mas o pilotos rechaçaram a idéia por conta da linha final onde o tempo
seria marcado ficar próximo da curva Nordkurve e isso poderia resultar em
acidentes e/ou capotamentos caso algum piloto perdesse o controle após a
freada. Levando em conta os protestos, a ideia da classificação foi deixada de
lado e partiram para o sorteio.
O grid ficou com Hans Stuck, Tazio Nuvolari e
Renato Balestrero na primeira fila; Goffredo Zehender e Manfred Von Brauchitsch
em segundo; Philipe Etancelin, Rudolf Caracciola e Louis Chiron na terceira;
Hann Rüesch e Raymmond Mays na quarta; Achille Varzi, Bernd Rosemeyer e Luigi
Fagioli na quinta; László Hartmann e Paul Piestch na sexta; Pietro Ghresi,
Hermann Lang e Piero Taruffi na sétima; Hanns Geier e Antonio Brivio fechando a
oitava fila.
Tazio Nuvolari contra o resto
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A largada para o Grande Prêmio da Alemanha de 1935, que estava em sua oitava edição |
Após o retorno dos alemães para as competições de
Grand Prix no ano de 1934, vencer os eventos realizados em solo alemão passou a
ser uma obrigação principalmente por conta de todo investimento que o governo
nazista depositava na Mercedes e Auto Union. E para aquele “Grosser Preis Von
Deutschland” não era diferente: os nove carros alinhados pelas duas
representantes alemãs tinha a tarefa de sair de lá com a vitória e no mínimo,
com os três lugares do pódio completos sem dar chance para os adversários.
Apenas a Scuderia Ferrari com seus três Alfa Romeo P3B é que ainda tinha
possibilidade, remota, mas tinha em tentar sair daquele fabuloso circuito com
um resultado que desse ao menos a chance de furar a bolha das duas equipes. Com
um publico de 250.000 mil e mais a presença de Adolf Hitler, eles
presenciariam que as 22 voltas previstas
para aquele GP entrariam para a história do motorsport alemão e mundial.
A chuva forte que caíra desde a noite, parou horas
antes da largada o que significou com que a prova seria disputada com a pista
molhada em sua grande parte, aumentando ainda mais a dificuldade num circuito
daquele porte. A grande novidade para aquele GP era a adoção de faróis para a
largada, abdicando do tradicional aceno da bandeira alemã para a partida. Como
é usado em sinais de transito, a luz vermelha foi acesa primeiro para depois a
amarela indicar que em poucos segundos a largada seria dada. Com a luza verde
sendo acesa os 20 carros saíram para prova, mas apenas 18 contornaram a
Südkurve: Hans Stcuk e Paul Piestch não conseguiram sair de suas posições e as
coisas pioraram quando o mecânico do carro de Stuck, Rudolf Friederich, pulou o
muro para tentar ajudar o piloto – o cambio não engatou e o motor apagou em
seguida – e no momento que ele corria por detrás do carro de Stuck, Varzi acabou
acertando o mecânico com uma das rodas de seu Auto Union. Friederich caiu
inconsciente e foi lavado ao hospital onde passou cerca de um mês internado em
Adenau e recuperou-se, porém perdendo a memória dos momentos que antecederam o
acidente.
Com toda essa confusão na linha de largada a
corrida transcorria já com Tazio Nuvolari liderando os primeiros metros, mas
sendo superado por Caracciola que completou a primeira volta na liderança com
Tazio em segundo e Fagioli em terceiro. O mantuano era o único carro da
Scuderia Ferrari entre quatro carros alemães, sendo três Mercedes e um Auto
Union. Com o circuito ainda bem molhado
– e em partes até encharcado – Nuvolari continuava com uma tocada forte para
manter-se o mais próximo possível de Caracciola e também para se se afastar de
possíveis investidas de seu compatriota Fagioli, mas na segunda volta o piloto
da Scuderia acabou exagerando e rodando na curva Bergwerk. Essa rodada custou
caro para Tazio, uma vez que a sua diferença para Fagioli naquele momento
chegava aos dez segundos de vantagem e agora o piloto italiano despencava para
sexto na classificação.
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Rudolf Caracciola parecia caminhar fortemente para mais uma conquista no "seu circuito" quando o rendimento passou a cair drasticamente, o que possibilitou a chegada de Bernd Rosemeyer e de dos outros pilotos. Sua velocidade continuou a cair durante a prova, o que tirou dele a chance de, ao menos, brigar pela vitória. Horas depois soube-se que ele tinha um grande verme. Por recomendações do Dr. Gläser, que acompanhava a Mercedes nas corridas, Caracciola comeu arenque azedo marinado na noite da segunda-feira e sarando do problema já na terça-feira |
Sem a presença de Nuvolari por perto a prova
parecia estar mais tranquila para Caracciola, mas o emergente Bernd Rosemeyer
com seu Auto Union era o piloto a ser temido: durante a terceira volta a pista
passou a secar e com isso Rosemeyer conseguiu diminuir a diferença para a
Mercedes de Rudolf para sete segundos, indicando que em breve podia ter uma
luta pela liderança. A perseguição de Bernd para Rudolf continuou na quarta
volta quando o piloto da Auto Union diminuiu a diferença ainda mais, baixando
para quatro segundos. Uma luta entre o grande ídolo e o futuro ídolo do
automobilismo alemão era quase certa. Mais atrás, Louis Chiron mostrava boa
velocidade ao ultrapassar o Mercedes de Brauchitsch pelo quarto lugar.
Rudolf Caracciola sabia muito bem domar a situação
e com a crescente do jovem Rosemeyer, Rudolf acelerou e recuperou uma parte
dessa vantagem ao subir dos quatro segundos para quase seis e se manter na
liderança, mas na sexta volta é que as coisas pioraram para Bernd: o piloto da
Auto Union exagerou em sua condução e acabou escapando para fora da pista no
trecho da Breidscheid. Uma das rodas traseiras danificou e para complicar ainda
mais, a lama e grama acabou entrando no motor e prejudicou até mesmo o
acelerador. Um pequeno desastre que privou o público de uma grande disputa e
também tirou de Rosemeyer a chance de vencer, uma vez que este problema no
motor acabou perseguindo ele pelo restante da corrida.
Caracciola manteve a sua liderança e agora com uma
diferença acima dos trinta segundos sobre Fagioli e isso indicava que o piloto
alemão podia passar a administrar a seu gosto. A pista secava ainda mais e isso
proporcionava aos pilotos a oportunidade de baixar seus tempos de voltas e foi
aí que Tazio ressurgiu na corrida ao descontar a diferença para Brauchitsch e
ultrapassar o piloto da Mercedes no meio do circuito para assumir a terceira
posição. Vale lembrar que Nuvolari tinha subido para quarto beneficiado com os
problemas enfrentado por Louis Chiron – que teve um pistão quebrado e também
com a parada de box de Rosemeyer para reparos em seu Auto Union após a
escapada. Outro fato ainda envolvendo Nuvolari era de ser o único piloto da
Scuderia Ferrari na pista com os abandonos de seus companheiros Chiron e Brivio
– este na primeira volta por problemas no diferencial. Mas a terceira posição
de Tazio duraria apenas uma volta, quando Brauchitsch recuperou a posição no
complemento da oitava volta.
A pista estava bem seca na altura da nona volta
quando Luigi Fagioli caiu de segundo para quinto de forma inexplicável. A
batalha entre Nuvolari e Brauchitsch pelo terceiro lugar premiou o italiano
acabou subindo para segundo de imediato após a queda na classificação de
Fagioli. A condução de Tazio mais o rendimento do Alfa Romeo P3B naquela
corrida, deixava os adversários impressionados. Era de se esperar um bom
andamento dos carros italianos naquela prova devido a sua melhor velocidade na
parte sinuosa, já detectado nos treinos livres, mas aquela apresentação de
Nuvolari enfrentando os carros alemães fora algo impressionante, principalmente
quando anotou uma volta abaixo dos dez minutos (10’57’’8) enquanto que os
pilotos da Mercedes e Auto Union marcavam suas voltas na casa dos 11 minutos.
A grande condução de Nuvolari acabou lhe rendendo a
liderança quando a prova estava na décima volta. Ele aproximou rapidamente de
Caracciola e fez a ultrapassagem e tratou logo de abrir boa vantagem. Rudolf
não estava em seu grande momento e no embalo de Tazio, apareceu Rosemeyer que também
vinha em grande recuperação após os problemas adquiridos em voltas anteriores,
levando os dois a andarem lado a lado por alguns metros. Brauchitsch também
estava próximo de seus dois compatriotas, mas apenas comboiando-os. Tazio
estava com boa folga na liderança colocando nove segundos sobre a trinca alemã,
quando foi para os boxes após completar a 11ª volta. Neste instante, Rosemeyer
havia subido para segundo e Brauchitsch para terceiro, relegando um
irreconhecível Caracciola para quarto e os três acabariam indo aos boxes
também. Os trabalhos de box de Mercedes e Auto Union foram relativamente
rápidos, sendo o de Brauchitsch o mais veloz (47 segundos) o que deu a ele a
oportunidade de voltar na frente de Caracciola e Rosemeyer. Tazio Nuvolari, que
havia parado bem antes quando estava na liderança, teve uma parada totalmente
desastrosa quando os mecânicos quebraram a alavanca da bomba de combustível e
tiram que colocar a gasolina por via de um funil, o que fez demorar de forma
considerável a sua parada. Para quem havia entrado nos boxes como líder e com
quase dez segundos de vantagem, saiu de lá com quase 1 minuto e 30 segundos de
atraso e na sexta colocação.
Com a parada de box dos líderes, Fagioli assumiu a
liderança por toda volta de número 12, mas acabou fazendo sua parada de box ao
final desta e deixando a liderança para Brauchitsch que agora tinha uma
confortável diferença de 40 segundos para Rosemeyer e Caracciola. Nuvolari
subiu de sexto para quarto com as paradas de box de Fagioli e Stuck que iam a
sua frente, mas a sua distância para o trio alemão ainda era bem grande. Com
pista livre, Manfred Von Brauchitsch abriu ainda mais vantagem sobre Rosemeyer
e Caracciola na volta 13 quando a marca subiu para 1 minuto e 9 segundos. Por
outro lado, Nuvolari continuava com a sua recuperação e agora estava apenas
nove segundos de Rosemeyer que ia em segundo, mostrando que o seu ritmo não
tinha sido abalado pela péssima parada de box. Nessa volta era a vez de outro
italiano sofrer problemas durante a parada de box: Fagioli perdeu mais de três
minutos nos boxes para que a os amortecedores fossem apertado. Uma volta
depois, quando a 14ª foi aberta, Rosemeyer precisou ir aos boxes para arrumar o
cabo do acelerador que voltou apresentar problemas ainda em decorrência da sua
escapada na sexta volta. Perdendo quatro minutos para que o cabo fosse
arrumado, Rosemeyer voltou em quinto e sem chances de disputar a vitória.
Brauchitsch estava em grande forma ao elevar a diferença para Caracciola em 1
minuto e 30 segundos, enquanto que Nuvolari, agora em terceiro, estava apenas
seis segundos de Rudolf – e a ultrapassagem do mantuano sobre Caracciola se deu
na volta 15, numa altura que a distância feita por Manfred tinha chegado até 1
minuto e 37 segundos.
Não havia nenhuma dúvida que agora os dois melhores
pilotos do GP alemão tinham sido postos a uma prova de gato e rato: Brauchitsch
tinha feito as primeiras voltas da corrida de forma discreta, batalhando apenas
contra o próprio Tazio nas voltas seis, sete e oito pela terceira posição, onde
o italiano acabou levando a melhor. Já Nuvolari, mostrara que a velocidade do
seu Alfa P3 estava em excelente forma enquanto que a sua condução dispensava
comentários. E o italiano continuou a forçar o ritmo quando completou a volta
16 descontando dez segundos para Brauchitsch, caindo a diferença para 1 minuto
e 26 segundos. E essa diferença desceria para 1 minuto e 13 segundos na volta
17, mostrando o quanto que Nuvolari estava determinado a ponto de pilotar com
extrema agressividade por todo circuito transformando até mesmo a grama em
pista. Mas tem que ser dito, também que a Mercedes estava preocupada com os
pneus do carro de Brauchitsch, tanto que Alfred Neubauer passou a pedir para
que seu piloto abrandasse o ritmo para preservar a borracha e o equipamento.
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Manfred Von Brauchitsch no Karussell: Não pode-se negar que Manfred era um dos pilotos mais velozes da equipe Mercedes Benz naquele período dos anos 1930. Por outro lado o seu trato com o carro e pneus sempre o deixaram a mercê de problemas. Este GP da Alemanha de 1935 talvez tenha sido a sua melhor apresentação ao volante dos Mercedes, mas não ter seguido as recomendações de Carl Dietrich, então Chefe do Departamento de Corridas dos Pneus Continental, custou caro para ele. (Foto: @meikelangelo/gramho.com) |
Os cuidados de Brauchitsch com os pneus resultaram
ainda mais na diminuição da diferença por conta de Tazio, que conseguira baixar
para 47 segundos na 18ª volta. Manfred decidiu aumentar o ritmo na 19ª volta ao
conseguir elevar para 53 segundos para o piloto italiano. Apesar dos aparentes
problemas nos pneus, Brauchitsch parecia que ainda tinha algumas reservas para
contra-atacar as investidas de Nuvolari. Na 20ª volta é que as coisas começaram
a entrar num drama quando Manfred verificou que seus pneus traseiros estavam
bem gastos e ele sinalizou para os boxes sobre isso, indicando para as rodas de
trás. De imediato Alfred Neubauer tratou de organizar os boxes para que
Brauchitsch fizesse a sua parada na próxima passagem. Neste momento a diferença
do alemão para Tazio Nuvolari tinha caído para 42 segundos, já que o piloto
italiano tinha feito uma volta onze segundos mais veloz que Manfred – 10’47 de
Tazio contra 10’58 de Brauchitsch. Quando a 21ª volta foi completada,
Brauchitsch não parou nos boxes, deixando a equipe Mercedes sem entender nada,
já que ele sinalizara na volta anterior. O piloto alemão aumentou o ritmo
naquela volta 21 sendo três segundos mais veloz que Nuvolari e subindo a
diferença para 45 segundos. Faltando apenas uma volta para o final, ao passo
que Manfred Von Brauchitsch caminhava para um grande conquista em Nuburgring, a
preocupação da Mercedes aumentava ainda mais quando eles avistaram os pneus do
carro de Manfred bem deteriorados. Aquela derradeira volta nos 22,810km de
Nurburgring era de pura tensão e mais nada. Seria difícil saber se os pneus do
Mercedes W25B de Manfred Von Brauchitsch resistiriam mais volta, mas ele fez a
sua escolha e entregou o seu destino a sorte. Mais atrás, Tazio Nuvolari
continuava a sua caçada e mesmo que os pneus de Alfa Romeo P3B estivesse
gastos, o italiano ainda conseguia tirar o máximo do carro.
Os dois pilotos continuaram a toda naquela volta
final sem aliviar seus carros, mas as coisas passaram a mudar quando Nuvolari
começou a reduzir de forma drástica a diferença de 45 segundos que o separava
de Brauchitsch por aquele percurso sinuoso. Ficava claro que o Mercedes de
Manfred estava perdendo rendimento de forma absurda e as coisas pioraram quando
o pneu do traseiro esquerdo estourou no momento que ele contornava o Karussell,
Brauchitsch ainda conseguiu controlar o carro e andar alguns metros em três
rodas, mas seria inevitável fazer algo contra o espetacular Tazio Nuvolari que
ultrapassou o Mercedes para assumir a liderança. O surgir do Alfa Romeo de
Nuvolari para receber a quadriculada foi uma tremenda surpresa negativa para
todos que estavam presentes ali no circuito, mesmo sabendo que a prova feita
pelo piloto italiano tinha sido fora de série. Enquanto que Tazio vencia do
Grosser Preiss, Brauchitsch tentava ainda ficar com o segundo lugar, mas o
estourou do pneu traseiro direito o deixou sem nenhuma chance de conseguir o
pódio ao ser superado por Hans Stuck, Rudolf Caracciola e Bernd Rosemeyer. O quinto lugar de Manfred deixou um
gosto para lá de amargo, onde o piloto não conseguiu disfarçar a decepção e chorou.
Independentemente do que tenha acontecido com as
duas equipes alemãs – sendo que a Mercedes acabou não levando a sério as
recomendações da Continental sobre os pneus traseiros que estavam se
desgastando de forma absurda, principalmente no carro de Brauchitsch – a
conquista de Tazio Nuvolari foi a amostra do talento e esperteza do experiente
mantuano que percebeu, ainda nos treinos livres, que o carro de Antonio Brivio
era bem mais rápido que o dele e com isso ele pediu que os carros fossem
mudados – o que acabou por ser uma grande cartada de Nuvolari, uma vez que ele
acabou sendo o único carro da Scuderia Ferrari a completar a prova. E isso
surtiu efeito na corrida, com ele conseguindo manter no ritmo dos principais
carros alemães, queira na pista molhada, queira na pista seca e com tempos de
voltas parelhos aos de Brauchitsch com quem duelava desde as primeiras voltas.
O melhor trato com os pneus, também auxiliado por um carro com potência menor
que ajudava, também, na conservação dos mesmos, foi primordial para toda a
construção para chegar a uma vitória espetacular frente a um público que
acreditava fortemente que um carro alemão, especialmente pilotado por um piloto
da casa, fosse o vencedor. Isso foi muito bem visto no pódio quando os organizadores
não tinham o hino italiano e Nuvolari consertou esta situação ao pegar seu
disco, que ele levava em todas as competições, e emprestar para que a Marcia
Reale fosse tocada.
Numa temporada que foi dominada e vencida pela
Mercedes, com Rudolf Caracciola tornando-se o grande campeão europeu, foi a
conquista de Tazio Nuvolari com um Alfa Romeo P3 já superado em todos os
aspectos pelos alemães que chamou atenção e ajudou – e ainda ajuda – a coroar o
já espetacular mantuano como um dos melhores pilotos de todos os tempos.