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(Foto: italianways.com) |
Maria Antonietta em seu Alfa Romeo ES pouco antes de
iniciar a sua participação na edição de 1922 da Targa Florio. Naquela ocasião
foi a segunda participação dela na grande prova, tendo competido em 1920 e
abandonado por problemas mecânicos em seu Buick. Em 1922 não teve sorte e
voltou abandonar. A Baronesa Maria Antonietta D’Avanzo foi uma das primeiras
mulheres a participar de grandes corridas daquela época, como a Targa Florio e
Mille Miglia que eram os grandes expoentes do esporte a motor naquele período e
teve a oportunidade, também, de ser a primeira mulher a pilotar no oval de
Indianápolis, mesmo que tenha sido apenas um teste nos anos 30. Sua carreira
durou um pouco mais de vinte anos.
A italiana Maria Antonietta Bellan nasceu em 5 de fevereiro
de 1889 em Contarina Veneta, cidade que mais tarde chamaria-se Porto Viro. Teve
seu primeiro contato com veículos ainda quando criança quando andou, escondida
de seu pai, num triciclo De Dion e isso incentivou seu pai a ensiná-la a
dirigir. O gosto pelo automobilismo foi instantâneo e foi sendo refinado no
passar dos anos até que casou em 1908 com o Barão Eustacchio D’Avanzo que logo
percebeu a paixão de Maria pelo motorsport e a incentivou na prática da
competição quando lhe comprou uma SPA de 35cv alguns anos depois – neste período
ela teve dois filhos: Luisa em 1909 e Renzo em 1911, que viria a ser ator.
Infelizmente, com a eclosão da Primeira Guerra Mundial, o início de sua
carreira teve que ser adiada.
Quando as competições voltaram em 1919, a agora Baronesa
Maria Antonietta D’Avanzo teve a sua primeira oportunidade em competições
quando se inscreveu para o Giro Del Lazio de 1919 (alguns locais destinam a
data a 1920, causando certa confusão) com o seu SPA de 35cv. Apesar de
problemas – entre eles uma roda solta que ela teve que arrumar durante a prova –,
Maria acabou por vencer na sua classe. E assim começava uma importante carreira
para uma das pilotos mais influentes do universo feminino no motorsport.
Para 1920 ficou marcada a sua primeira tentativa na famosa
Targa Florio: correndo com um Buick, Maria acabou por abandonar na terceira
volta quando o motor falhou. Naquele ano não se tem registros dela participando
em outros eventos.
Em 1921 ela pilotou um Ansnaldo 4CS no circuito de Garda,
numa ocasião onde ela era piloto reserva
e entrou para substituir o titular que havia passado mal um dia antes da
competição – na mesma equipe competia um então novato Tazio Nuvolari. Ela
terminou em sétimo na geral e em terceiro na sua classe. Alguns meses depois
ela venceu a Coupe des Dames pilotando um Alfa Romeo 20/30 em Brescia, num
evento que ficou conhecido como“Motor Sport Week”. Ainda naquele ano
ela participou de uma prova numa praia de Fano, na Dinamarca, onde pilotou um
Packard de doze cilindros. Maria venceu a primeira corrida, mas durante a segunda
prova o Packard teve um incêndio que a
obrigou a dirigir o carro por um breve período nas águas, para que pudesse
conter o avanço das chamas no carro. Não se sabe a real posição de chegada de
Maria ou se ela teria abandonado este evento, mas a história que ficou é dela
ter conhecido Enzo Ferrari na ocasião e este ficou impressionado com a sua
velocidade e coragem, principalmente após presenciar a cena do incêndio. Houve
também o relato de Ferrari, que teria ouvido Maria falar que gostaria muito de
trocar o carro (Packard) por um FIAT. Tanto ele quanto Antonio Ascari, que
também esteve presente na corrida na Dinamarca, teriam ouvido e prontamente
resolveram realizar a vontade da piloto: quando Maria voltou para sua casa na
Itália, um FIAT vermelho estava a sua espera e o já surrado Packard foi levado
por Ascari que o renovou e colocou novamente em uso algum tempo depois. No
decorrer daquele ano Maria ainda participou de outra prova em Brescia, essa
intitulada de “Grand Prix Gentleman”
onde participou com o mesmo Alfa Romeo 20/30 que vencera a Coupe des Dames
meses antes. Nesta prova, ela duelou contra Conde Giulio Masetti que pilotava
um Mercedes 18/100. Masetti venceu e Maria terminou em terceiro.
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Maria e seu Buick antes da sua estréia na Targa
Florio de 1920
(Foto: italianways.com) |
Em 1922 o único relato de participação de Maria em alguma
competição foi na Targa Florio, onde ela competiu com o Alfa Romeo ES e abandonou
com problemas mecânicos na primeira volta. A vida de Maria foi um tanto
conturbada na ocasião já que separara de seu marido e acabou rumando para a
Austrália com os filhos onde comprou uma fazenda e iniciou um negócio agrícola.
Houve relatos dela participando de alguns eventos na Austrália, mas pouco se sabe
de seus resultados. Porém, foi um período onde se formou como jornalista e também
criou gosto pela aviação, mas a sua paixão pelo automobilismo era ainda forte e
em 1926 ela voltou à Itália e consequentemente as corridas.
A primeira competição de que ela participou naquela retomada
foi na Coppa Della Perugina disputada em maio de 1926, onde se inscreveu com um
Mercedes 180HP K na classe destinada a carros acima de 1500cc. Maria teve ótimo
desempenho e mais uma vez fechou em terceira na sua classe. D’Avanzo voltaria
ter um nome listado novamente para uma prova quando se inscreveu para a Mille
Miglia de 1928, onde fez a sua estréia ao lado do brasileiro Manuel de Teffé.
Os dois dividiram um Chrysler Tipo 72 que foi inscrito para a classe de carros
de 5000cc e assim como em outras oportunidades, eles não tiveram sorte e abandonaram
ainda no inicio por problemas no motor. Ela retornou a Mille Miglia em 1929
para competir com um Alfa Romeo 6C 1750 SS que foi dividida com Carlo Bruno. A
exemplo do que acontecera em 1928, ela não completou a prova.
Maria tirou um ano sabático em 1930, retornando em 1931 onde
disputou duas importantes provas: na Mille Miglia ela competiu com um Bugatti
T43 ao lado de Carlo Castelbarco na classe acima de 3000cc e abandonou; na subida
de montanha em Grosseto chamada de Coppa
Pierazzi competiu com um Alfa Romeo e terminou em terceira.
Maria teve uma boa oportunidade para 1932: Enzo Ferrari a
chamou para compor a equipe Scuderia Ferrari na Mille Miglia daquele ano. Maria
teve a sua disposição um Alfa Romeo 6C 1750 GS Spider Touring que conduziu
junto de Francesco Severi e do mesmo modo que nas suas outras duas
participações, a sua estadia na prova durou pouco e abandonou ainda no inicio. O
ano de 1932 ainda reservaria outra grande chance para ela: Ralph de Palma, um
dos grandes pilotos dos EUA e então vencedor das 500 Milhas de Indianápolis de 1915, já
acompanhava a sua carreira e lhe fez um convite para testar um Miller Special
em Indianápolis. Maria conseguiu uma licença especial para o tal teste, uma vez
que mulheres eram proibidas de correrem no já famoso oval. O teste não foi
promissor e Maria acabou desistindo antes que fosse feita sua inscrição para
edição daquele ano.
As aparições de Maria Antonietta a partir de 1933 passaram a
ser menores. Em 1933 ela teria se inscrevido para a Targa Abruzzi, mas não tem
nenhum registro a respeito de sua participação ou não nessa corrida – apenas o
nome de Giovanna Maria Medici é que aparece na relação de inscritos, sendo a
única mulher naquela edição. Ela se inscreveu para a Targa Abruzzi de 1938 com
um FIAT Stanguelini, mas não correu. Para 1939 ela se inscreveu para a
Tobruk-Tripoli para competir com o mesmo FIAT Stanguelini e nesta edição ela
terminou em sexta na sua classe para carros de até
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(Foto: italianways.com) |
1100cc. Sobre a prova de
Tobruk-Tripoli, esta substituiu a Mille Miglia que foi realizada normalmente em
1938. Um acidente nesta edição de 38, após um Lancia Aprilia escapar e ir em
direção ao publico matando dez pessoas quando a prova passava por Bolonha, fez
o Automóvel Clube da Itália interferir e proibir provas nas ruas de Bolonha. Para
1939 a idéia foi levar a prova para o norte da África realizando a etapa entre
Tobruk-Tripoli, nesta que ficou conhecida como a “Mille Miglia Africana”. Para
1940 a corrida retornou a Itália, mas com um percurso menor – sem a parte de
Bolonha – que incluía Brescia, Cremona e Mantova e na ocasião a prova chamou-se
“Grande Premio de Brescia Della Mille Miglia”. Por falar nesta prova de 1940,
esta foi a última em que Maria Antonietta D’Avanzo se inscreveu para correr com
um FIAT 1100 em parceria com Angelo Della Cella, algo que não chegou acontecer.
Após esta última tentativa, Maria encerrou a sua carreira automobilística
após vinte anos de competição. Porém, neste período, além de ter conquistado
notoriedade, alcançou respeito e admiração de senhores como Enzo Ferrari, Ralph
de Palma e outros pilotos com quem dividiu as pistas. Esse foi um fator que
ajudou encorajar outras mulheres que vieram depois dela a entrar no motorsport
e continuar o legado.
Num livro escrito por Gigliola Gori chamado de “Facismo Italiano e o Corpo Feminino:
Esporte, Mulheres Submissas e Mães Fortes”, ela inclui uma fala de Maria D’Avanzo
de 1928 sobre a importância da mulher
atrás de um volante: “Quando eu dirigi meu carro pelas ruas
italianas pela primeira vez, vi pessoas tentando se salvar pulando na calçada.
Hoje, no entanto, uma mulher pode dirigir com facilidade, com a mesma segurança
e capacidade de um homem. Nets vida tumultuada, um carro é cada vez mais
necessário: ‘uma mulher motorista perde a sua feminilidade?’ Eu penso que não.
Pelo contrário, sugiro que a sua figura elegante se encaixe perfeitamente na
linha de um carro e que se eles se complementem.”
Maria Antonia D’Avanzo morreu na Itália em 17 de janeiro de 1977 aos 87 anos.