Frank
Williams tinha vagueado durante a década de 70 buscando um lugar ao sol na F1.
Inicialmente com um Brabham BT26 entregue a Piers Courage, no final dos anos
60, onde o piloto britânico conseguiu dois pódios, nos GPs de Mônaco e EUA.
Bons resultados, promissores, que deveriam aumentar pelos anos seguintes caso
Courage não tivesse morrido em Zandvoort, durante o GP holandês de 1970.
Naquela época Frank tinha se associado com a De Tomaso, mas a fábrica saiu de
cena ao final daquele ano. Em 1972 voltou com um March modificado e batizado de
FX3, que foi entregue a Henry Pescarolo e José Carlos Pace que se revezaram no
volante deste carro durante aquela temporada, mas sem conquistar nenhum grande
resultado. Bom resultado mesmo, só apareceu dois anos mais tarde quando Jacques
Laffite subiu ao pódio na segunda posição do GP da Alemanha, em Nurburgring.
Baita resultado. Mas isso era apenas uma válvula de escape para que Frank
sorrisse. Ele sabia que tinha muito a ser feito para que pudesse chegar ao
topo, como tinha conseguido a sua fonte inspiradora Ken Tyrrell.
Frank
tinha uma série de dívidas altas. Os tempos em que acertara contratos para
levantar fundos para o sustento da sua equipe, a partir de uma cabine
telefônica com dois saquinhos de moedas, mostravam bem o espírito que Williams
tinha e nem mesmo o fato de mecânicos jogarem aos quatro ventos para a imprensa
o fato de estarem com os seus salários atrasados há meses, ou então oficiais de
justiça que iam todo santo mês ao galpão onde a equipe funcionava, em Reading,
cobrar o aluguel, fazendo com que aquele local fosse deixado de lado por algum
tempo até que a divida fosse sanada, não o desanimara. Porém, em 1976, afundado
em dívidas, repassou o time para o petroleiro canadense Walter Wolf que, por
muito pouco, não se tornou campeão do mundo em 1977 quando Jody Scheckter
discutiu essa hipótese contra Niki Lauda, da Ferrari. Curiosamente, aquele foi
o ano de renascimento da Williams, com Frank a retornar ao circo tendo como sócio
e engenheiro Patrick Head. O belga Patrick Neve era o piloto da vez, mas assim,
como nas outras oportunidades, Frank não tinha dinheiro para comprar um carro
novo. Os March mais novos custavam em torno de 15.000 libras e sem dinheiro,
Frank teve que contentar-se com um March antigo que mais tarde foi descoberto
que era de 1975, devido uma série de decalques e pinturas de antigos
patrocinadores quando o carro foi ser reparado. Neve não marcou um mísero ponto
sequer para a equipe, mas o fato de terem se reerguido já era um grande lucro.
Isso só veio acontecer em 1978, quando Head assinou o primeiro carro
genuinamente Williams: o FW06 que foi entregue a Alan Jones. Com dinheiro dos
árabes da Fly Saudia, Frank, enfim, teve uma temporada tranquila em termos
financeiros e pôde trabalhar mais calmamente. O carro teve uma série de
problemas no decorrer daquele ano, mas Jones salvou onze pontos e dois pódios
para a equipe (Kyalami 3º e Watkins Glen 2º). Para 1979, Head já trabalhava num
carro totalmente voltado para o efeito solo.
Aqueles
dias de 1979 estavam um tanto tensos. A FIA ameaça tirar de cena o efeito solo,
mas as equipes bateram o pé sobre o veredicto da entidade que teve que recuar.
Na pista o domínio naquele início de campeonato estava dividido entre a Ligier
e Ferrari. Gerard Ducarouge tinha conseguido ler bem o sucesso dos Lotus asa de
1978, e aplicou perfeitamente nos Ligier JS11 que Jacques Laffite e Patrick
Depailler puderam vencer três das seis primeiras corridas daquele mundial com
certo domínio. Do outro lado a Ferrari esteve bem naquela abertura de
campeonato, vencendo duas com Gilles Villeneuve e duas com Jody Scheckter. A
Lotus, que havia dominado de forma avassaladora o
|
A estréia do FW07 em Jarama. Jones e Rega abandonaram |
mundial de 78, não estava em
grande forma naquele ano, contava apenas com alguns punhados de pódios
conquistados, em sua maioria, por Carlos Reutemann. A Renault era outra forte
oposição que tinha mostrado do que era capaz com a pole de Jean Pierre
Jabouille em Kyalami, que fora a primeira da equipe e de um motor turbo na F1.
O próprio Jabouille é quem conduziu a Renault a sua primeira vitória meses mais
tarde em Dijon, na disputa do GP França, no qual ficou marcado o duelo visceral
entre Villeneuve e Arnoux pela segunda posição.
A
Williams ainda caminhava a passos curtos, mas as coisas mudariam na metade
daquele mundial. Inicialmente competindo com o FW06 modificado, Jones e
Regazzoni não tiveram grandes sucessos, salvo apenas a terceira posição que
Alan havia conseguido em Long Beach. Nessa mesma corrida é que fora apresentado
o FW07, mas ficou apenas nos boxes da equipe. Mas aquela manobra em levar a
deixar o novo carro nos boxes, foi uma estratégia como contou Patrick Head anos
mais tarde: “Nós tínhamos um FW07 pronto em Long Beach, mas apenas para
nossos patrocinadores árabes conhecerem o carro. Depois da corrida, nós o
levamos ao Ontário Motor Speedway. Alan deu três voltas, voltou aos boxes,
pulou fora do carro e disse: ‘Agora eu sei por que aquelas malditas Lotus
levam tanta vantagem. Eu posso derrapar controlando este carro, faço qualquer
coisa com ele. Ele tem muita aderência. ’ Sem necessidade de dizer que ele
deu outras 50 voltas controlando o carro como se estivesse subindo para um novo
nível de aderência. O FW07 era bom desde o início.”.
Apesar
deste resultado promissor em Ontário, as coisas foram bem diferentes quando o
novo bólido foi para o seu primeiro GP. Em Jarama o carro estreou, mas deixou o
duo da equipe a pé com Jones a
abandonar por problemas na caixa de câmbio e
Regazzoni com motor estourado. Alan ainda pôde assinalar a segunda melhor volta
da corrida e em Zolder ele liderava quando uma pane elétrica o tirou
da prova
faltando 30 voltas para o fim. Em Mônaco, quando parecia que a equipe colocaria
os dois carros no pódio, com Rega em segundo e Jones em terceiro, o australiano
errou e bateu a poucas voltas do fim. Clay garantiu o segundo lugar
praticamente colado na Ferrari de Scheckter. Já em Dijon, Alan foi quarto e
Rega o sexto. As coisas mudariam de figura em Silverstone.
O carro
era rápido e muito bom, mas precisava de acertos. Isso ficou deflagrado quando
descobriram uma abertura na parte inferior de uma das laterais do motor Ford
Cosworth, onde o ar escapava com facilidade. Para Head, aquela abertura não era
tão importante e só notou o quanto que aquilo prejudicava o carro num teste
feito em Silverstone uma semana antes do GP.
Frank
Dernie, que entrara no time em janeiro daquele ano, conta como achou a solução
para o vedamento daquela seção, uma vez que a discussão estava aberta se iam,
ou não, vedá-la: “Nós, por diversas razões, procurávamos inicialmente
encontrar nos testes uma solução para vedar o espaço aberto nas laterais
inferiores do motor. Foi então que eu bolei uma carenagem para a seção inferior
do carro, em torno do motor, que acabou sendo o mais importante desenvolvimento
que descobrimos no túnel de vento. Tão importante que decidi testá-la na semana
do GP. Assim, na segunda-feira analisei a proposta, na terça desenhei a peça,
que na quinta já estava sendo construída na fábrica. Este foi um grande avanço
no desenvolvimento do efeito solo.”.
Ás vezes
você acha que uma simples mudança em algo banal, não fará tanta diferença. Mas
o que foi visto em Silverstone, na abertura dos treinos, foi algo absurdo. O
FW07 tinha passado de um bom carro, para um excelente carro fazendo com que
Jones dominasse as ações durante os treinos. Isso levou Frank a ficar abismado
positivamente a cada vez que olhava os tempos no cronômetro e os chefes e
engenheiros de outras equipes a ficarem assustados. A classificação tinha sido
ainda mais fácil. Alan errara na sua primeira saída e danificara a asa
traseira. Voltou aos boxes e baixou a bota, cravando um tempo brutal: 1’11’’88.
Uma marca monstruosa, já que o próprio Jones, em outra oportunidade, tinha
feito 1’13 sendo o único a andar nessa casa. “Literalmente, todo mundo no
pitlane estava em silêncio: atordoados. Ninguém conseguiu chegar perto do tempo
da pole-position de Alan. Era óbvio que estávamos em boa forma, certos de que
não teríamos maiores problemas.”, relembra Patrick Head.
Largando
na frente, Jones teve a tranquilidade para sustentá-la e distanciar-se aos
poucos do Renault de Jabouille, que vinha logo em segundo. Piquet, que saíra em
terceiro e despencara para quarto, vinha acompanhando bem os três primeiros,
mas acabou por rodar ao fim da primeira volta e abandonar. A corrida
transcorreu bem até a 17ª volta quando Jabouille passou a ter problemas nos
pneus que estavam desgastados e foi ao box. Passado algumas voltas o motor
turbo estourou, deixando o piloto francês a pé. Neste momento a Williams
posicionava seus dois carros nas duas primeiras posições em Silverstone. Um
resultado que Frank Williams nem imaginava inicialmente, já que o próprio
dissera que havia sonhado com o domínio absoluto dos Renaults na pista inglesa
após o desempenho absolutos destes em Dijon. Mas era realidade e era possível
que a Williams vencesse aquela corrida com uma dobradinha. Infelizmente essa
possibilidade se desfez na 38ª passagem,
|
Os festejos de Regazzoni em Silverstone, junto de Arnoux e
Jarier |
quando Jones abandonou com falha na
bomba de água. Aqueles problemas de juventude do carro, que aparentemente
parecia ter sumido naquele fim de semana, ainda rondavam os carros brancos de
Frank. Ao menos, naquele momento, eles tinham em Clay Regazzoni a esperança de
conquistar a vitória naquela tarde. Porém o temor de um novo problema existia,
afinal ainda faltavam trinta voltas para o término. Seria uma agonia
interminável. Por outro lado, Rega tinha uma boa distância para Arnoux e vinha
fazendo boas voltas, inclusive a mais rápida da corrida em 1’14’’40. Os temores
da Williams dissiparam-se quando Clay cruzou a linha de chegada em primeiro,
com 24s de vantagem sobre René Arnoux. Frank tinha conquistado a sua primeira
vitória como construtor.
Mas essa
vitória foi um misto de sentimentos que Neil Oatley, que era o engenheiro do
carro de Clay, explicou depois: “Eu era o engenheiro do Clay naquele ano,
então era obviamente fantástico que meu piloto ganhasse. Mas,
compreensivamente, havia uma mistura de sentimentos na equipe por causa da
relação do Alan com Frank e Patrick e o fato dele ter contribuído muito para o
desenvolvimento da equipe.”.
Frank não
era de festas e junto de sua esposa Virginia, se refugiou no pequeno motor-home
da equipe. “Nós queríamos que o dia não terminasse. Nós sentamos na pequena
varanda do motor-home e assistimos o pôr-do-sol. Enquanto as pessoas estavam
indo embora, Frank não queria sair do circuito. Tinha apenas um sentimento: Nós
ganhamos o Grand Prix! Foi extraordinário. Inesquecível.” contou Virginia. O
campeonato ainda reservou à Williams outras quatro vitórias, todas com Alan
Jones nos GPs da Alemanha, Áustria, Holanda e Canadá.
Frank Williams tinha conseguido alcançar seu grande objetivo, traçado ainda no já distante final dos anos 60 quando iniciou a sua aventura. Mas com esse sucesso arrebatador na segunda parte de 1979, o caminho já estava trilhado.