O inicio de carreira de Kimi Raikkonen na Fórmula-1 foi dos
mais comentados da história da categoria até aquele começo de década: um piloto
com apenas algumas dezenas de corridas em monopostos poderia tomar partido dos
já brutais carros da F1 em 2001? As respostas começaram aparecer no teste que
ele fez em Mugello pela Sauber e os seus resultados foram os melhores
possíveis, a ponto da FIA lhe conceder uma licença especial para a sua estréia
na categoria em 2001 pela equipe de Peter Sauber.
Após um período de rápida aprendizagem naquele carro azul da
equipe suíça, Raikkonen foi alçado a piloto titular na McLaren exatamente no
lugar de seu conterrâneo bi-campeão mundial Mika Hakkinen. Assim como fizera na
Sauber, Kimi mostrou do que sabia e rapidamente dominou o quase decano David
Coulthard e só não conquistou a sua primeira vitória naquela temporada porque
escorregou no óleo deixado por Allan Mcnish na freada para hairpin em
Magny-Cours, quando liderava o GP francês com uma pequena diferença para
Michael Schumacher que veio a vencer a corrida e cravar o seu quinto título
mundial. Conquistaria a sua primeira vitória em Sepang, 2003 e naquele mesmo
ano, por muito pouco, não levou o título que foi ceifado por causa das inúmeras
quebras assim como acontecera em 2004, com um problemático MP4-19 que precisou
ser revisado algumas vezes devido a sua fragilidade que foi acusada nos testes
de resistência da FIA, forçando o uso de uma versão B deste carro. A sua
vitória em Spa naquele ano, acabou por salvar a temporada da McLaren. 2005
poderia ter sido o ano da desforra para Raikkonen, não fosse os inúmeros
problemas no motor Mercedes que arrancaram dele algumas possibilidades de
vitórias, mas azares extras, como em Nurburgring, também ajudaram a tirar dele
essa chance. Por mais que aquela temporada tenha sido decepcionante no plano da
confiabilidade, esta serviu para confirmar o grande talento de Kimi Raikkonen a
bordo de um carro de corrida e a etapa de Suzuka, a penúltima prova daquele
ano, celebrou a grande velocidade do finlandês.
Naturalmente como acontecia nos tempos em que Adelaide
sediava o final do campeonato e com este já definido, Suzuka recebeu a
penúltima corrida daquele ano com um ar amistoso. Com pilotos mais relaxados, a
tendência é que tivéssemos uma prova mais animada, desamarrada daquela tensão
natural pela decisão de um mundial de pilotos como acontecera semanas atrás em
Interlagos. O mais novo campeão do mundo, Fernando Alonso, já acenava que
voltaria à velha forma de sempre depois de ter feito as últimas corridas apenas
para colecionar os pontos que o levariam ao primeiro campeonato de sua
carreira. Mesmo com toda essa animação, ainda havia um campeonato em jogo: o
mundial de construtores estava em aberto, com a McLaren a liderar a tabela com
apenas dois pontos de vantagem sobre a Renault (164x162). Isso significaria
que, apesar dos pilotos das duas equipes estarem mais à vontade, ainda teriam
algo para conquistar para seus respectivos times. Com a aproximação de um tufão
nas redondezas de Suzuka – o que levantou a hipótese de possível cancelamento
da classificação – o treino que definiu o grid de largada viu uma formação bem
atípica: enquanto que Toyota e Honda formavam uma primeira fila em seu
território – pole para Ralf Schumacher e segunda posição para Jenson Button
–,os figurões pegaram chuva exatamente na suas voltas lançadas – naquela época,
cada piloto tinha direito a uma volta lançada para obter a sua melhor marca,
sendo que o primeiro a classificar era o último colocado da prova anterior e
assim seguia até o último piloto, exatamente o vencedor do último GP – e viu um
fundo de grid formado por Michael Schumacher (14º), Fernando Alonso (16º), Kimi
Raikkonen (17º) e Juan Pablo Montoya (18º). Kimi ainda teve o agravante de ter
o motor quebrado na sua volta veloz, o que obrigou a troca deste, mas sem que
tomasse punição.
Uma olhada rápida na formação das dez primeiras posições
indicava que Giancarlo Fisichella seria o favorito para a prova, afinal de contas
os grandes adversários estavam saindo do fundo do grid e ultrapassar em Suzuka
nunca foi uma grande facilidade. Isso ficou ainda mais claro quando o italiano
da Renault conseguiu uma saída bem melhor que Button e virou a primeira curva
em segundo, já na cola de Ralf Schumacher. Mais atrás, Takuma Sato e Rubens
Barrichello escapam para fora da pista, mas conseguem retornar. Enquanto que
Schumacher, Alonso e Raikkonen avançam o pelotão, Montoya se vê fora da pista
até encontrar a barreira de pneus, após uma dura disputa com Jacques Villeneuve
que vendeu caro a posição. Isso forçou a entrada do Safety Car para a remoção
do McLaren do colombiano e essa manobra de Villeneuve lhe rendeu 25 segundos de
acréscimo no seu tempo total como punição. Com a prova reiniciada, Alonso
tentou uma ultrapassagem sobre Christian Klien na freada da chicane, mas ele
acabara cortando. Devolveu a posição, mas na freada para a curva 1 ele retomou
a posição. Para os comissários a manobra ainda estava errada e entraram em
comunicação com a equipe francesa para que o espanhol devolvesse a posição ao
piloto rubro-taurino. Essa manobra lhe custou segundos preciosos que fariam
falta no final, mas algumas curvas depois, enfim, Fernando conseguia superar o
austríaco sem contratempos.
Enquanto que iniciava a primeira rodada de pit-stops que
deixaria Fisichella na liderança, um embate interessante acontecia no meio do
pelotão entre Schumi, Alonso e Raikkonen: algumas voltas de estudos procurando
o local certo para a tal manobra, Fernando efetuou uma das melhores
ultrapassagens da temporada e uma das melhores da história, ao atacar Michael
por fora na veloz e traiçoeira 130R. Apesar de todo esse esforço, o atual
campeão teve que ir aos boxes e dessa vez a batalha ficaria entre Raikkonen e
Schumi, mas o finlandês não conseguiria a ultrapassagem antes do seu primeiro
pit-stop. Após a parada dos dois, voltando à frente de Alonso, Kimi conseguiu a
manobra e agora estava no encalço de Webber e Button, enquanto que Alonso
começava a sua investida sobre Michael, que resultaria em outra ultrapassagem,
mas desta vez na curva 1. A opção por duas paradas de Alonso o forçou a fazer
outro pit-stop na volta 36, deixando o caminho aberto para a retomada de
Schumacher. Fisichella, que estava 20
segundos à frente, também foi aos boxes, despencando para quarto na
classificação logo atrás de Webber, Button e Raikkonen.
O bote final: Raikkonen começa o movimento para a grande manobra sobre Fisichella |
Apesar de uma diferença larga que poderia ter dado a
Fisichella a chance de vencer a prova em Suzuka, as possibilidades começaram a
mudar quando Webber e Button pararam nos boxes e deixaram caminho aberto para
Raikkonen efetuar uma boa série de voltas – entre elas a melhor da corrida, com
o tempo de 1’31’’540 – e tentar pegar Giancarlo nas voltas seguintes. Quando
Kimi voltou de seu pit-stop, toda aquela diferença de mais de vinte segundos
que o separava de Fisichella havia despencado para um pouco mais de cinco
segundos. Uma atuação que só por si já valeria o dia, mas Raikkonen queria
mais... As últimas oito voltas foram vertiginosas, com o italiano tentando como
podia distanciar-se do perigo prateado que se aproximava cada vez mais.
Enquanto esse jogo de gato e rato acontecia na frente, Alonso continuava a sua
escalada: após superar Schumi pela terceira vez na corrida, tinha deixado
Coulthard para trás e agora buscava incansavelmente Webber e Button que foram
superados impiedosamente pelo espanhol, que chegara ao terceiro posto após uma
grande corrida. O desperdício de tempo nas devoluções de posições para Klien
atrasaram-no bastante.
Ganhando cerca de um segundo por volta sobre Fisichella,
Raikkonen tinha o italiano na sua alça de mira faltando três voltas para o fim.
Apesar de defender-se bem de algumas investidas do finlandês, o desfecho foi
favorável ao piloto da McLaren: conseguindo grudar no vácuo do Renault, Kimi
teve a sua passagem bloqueada por Fisichella que lhe fechara a parte de dentro
da grande reta, mas Raikkonen conseguiu levar o carro para esquerda e arriscar
a manobra por fora na freada da curva 1. Certamente foi de cortar a respiração e
Raikkonen estava à frente de Giancarlo naquela volta final e o finlandês tratou
de continuar na mesma tocada para vencer por uma margem de 1’6 segundos sobre
Fisichella. A saudação dos membros da McLaren e das pessoas que ali estava no
parque fechado foi estrondosa.
Foi a sétima vitória dele no campeonato e a nona na
carreira, e que acabou por ser a sua última pela McLaren. Mas certamente foi a
melhor de sua carreira, num dos melhores GPs da década passada.
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